Retrospecto de 93 anos de vida
Conforme narrado por Frederick W. Franz
NO DIA 12 de setembro de 1893 nasceu um menino em Covington, Kentucky, EUA, do lado meridional do rio, defronte de Cincinnati, Ohio. Seu pai feliz, Edward Frederick Franz, e a mãe encantada, Ida Louise, nascida Krueger, deram a este seu filho o nome de Frederick William Franz.
Este foi o começo dos meus 93 anos de vida. Meu pai, nascido na Alemanha, professava pertencer à Igreja Luterana, e por isso me mandou ser batizado, por um clérigo colocar sua mão umedecida na minha testa. Preencheu-se uma certidão de batismo, e esta foi emoldurada e pendurada na parede de nosso lar, ao lado das certidões de batismo de meus dois irmãos mais velhos, Albert Edward e Herman Frederick. Somente 20 anos mais tarde fiquei sabendo quão antibíblica era esta formalidade religiosa.
Foi quando nos mudamos para a Rua Greenup que eu vi pela primeira vez uma carruagem sem cavalo, um automóvel aberto, para duas pessoas, subindo a rua. Anos mais tarde, vi o primeiro avião. Morávamos então ao lado da Padaria Krieger, onde meu pai trabalhava de padeiro à noite. Ele voltava para casa de madrugada e ia logo dormir. Daí, à tarde, estava livre para passar algum tempo com nós, garotos.
Quando atingi a idade escolar, fui primeiro mandado à escola paroquial e aos ofícios religiosos da igreja católica romana de S. José, visto que ficava perto, na esquina da Rua 12 com a Rua Greenup. Ainda posso lembrar-me da sala de aulas. Em certa ocasião, o “irmão” religioso que atuava como professor me fez chegar à frente, diante dos estudantes, e esticar palma da minha mão, para receber várias batidas com uma régua de 30 centímetros, por alguma arte que eu fiz.
Lembro-me também de entrar no confessionário sem luz, na igreja, falar ao confessor que ficava atrás da divisória e recitar uma oração decorada, confessando que menino mau eu era. Depois me dirigi ao altar e me ajoelhei ali, e o sacerdote pôs um pedacinho de pão na minha boca, servindo-me assim a Comunhão, conforme ensinada pela Igreja, reservando o vinho para si mesmo e bebendo-o mais tarde sozinho. Este foi o começo da minha instrução religiosa formal e de meu respeito por Deus, que aumentaria nos anos posteriores.
Depois de um ano na escola paroquial, em 1899, minha família se mudou para o outro lado do rio Ohio, para Cincinnati, Rua May, 17 (agora chamada Rua 15 Leste). Esta vez fui mandado para a escola pública e para a terceira série. Eu mostrava ser estudante desatento, e me lembro de que, numa ocasião, o aluno da carteira à minha direita e eu fomos mandados ao gabinete do diretor por causa de mau comportamento. O diretor Fitzsimmons mandou que ambos nos inclinássemos para a frente e tocássemos com os dedos a ponta dos sapatos, enquanto ele nos batia várias vezes no traseiro com uma vara. Como se podia esperar, fui reprovado nos exames.
Mas o meu pai não estava disposto a me deixar passar dois anos na mesma série. De modo que, quando começou o próximo ano letivo, ele me levou a escola da Rua Liberty, ao gabinete do diretor, o senhor Logan. Pediu ao senhor Logan que me matriculasse na quarta série. O senhor Logan era bondoso para comigo, e disse: “Bem, vamos ver o que este jovem sabe.” Depois de eu responder a diversas perguntas esquadrinhadoras para a evidente satisfação dele, disse: “Ora, parece que está habilitado para a quarta série.” Assim ele pessoalmente me promoveu para a série seguinte àquela em que eu havia sido reprovado. A partir de então sosseguei e me esforcei seriamente com os meus deveres escolares, e nunca mais fui reprovado.
Mudou também o aspecto religioso da minha vida jovem. De algum modo, representantes da Segunda Igreja Presbiteriana de Cincinnati entraram em contato com a minha mãe, e ela decidiu mandar Albert, Herman e a mim à escola dominical daquela igreja. Naquele tempo, o senhor Fisher era superintendente da escola dominical, e a jovem Bessie O’Barr tornou-se minha instrutora nesta escola. Assim fiquei conhecendo a inspirada Bíblia Sagrada. Quão grato fiquei quando minha professora de escola dominical me deu de presente de Natal um exemplar da Bíblia Sagrada!
Decidi tornar obrigatório na minha vida ler um trecho da Bíblia todos os dias. Isto resultou em eu ficar bem familiarizado com este livro sagrado. E sua influência salutar impediu que eu me envolvesse na conversa e na conduta imorais dos meus colegas de aula. Não era de admirar que me encarassem como diferente.
Escola Secundária e Faculdade
Depois de formar-me na terceira escola intermediária, em 1907, meus pais me permitiram continuar meus estudos e ingressar na Escola Secundária Woodward, que Albert, meu irmão mais velho, cursara por um ano. Igual a ele, decidi fazer o curso clássico. Passei a estudar latim — estudo que prossegui durante os próximos sete anos.
Depois veio o tempo da formatura, na primavera (setentrional) do ano 1911. Fui escolhido para ser o orador da turma, representando a Escola Secundária Woodward, na formatura a ser realizada no maior auditório de Cincinnati, o Music Hall.
Na época, todas as três escolas secundárias de Cincinnati — a Escola Woodward, a Escola Hughes e a Escola Walnut Hills — se juntavam para as formaturas. Os formandos das escolas secundárias sentaram-se no grande palco, diante do auditório superlotado. O discurso inicial foi designado ao orador da turma da Escola Secundária Woodward. O assunto que eu escolhera para a ocasião era “Escola e Cidadania”. Todos os três oradores receberam generosas palmas. Eu estava então no meu 18.º ano de vida.
Meus pais permitiram-me prosseguir com a minha carreira educativa, de modo que me matriculei na Universidade de Cincinnati, fazendo o curso de humanidades. Eu decidira tornar-me pregador presbiteriano.
À continuação do meu estudo de latim acrescentei então o estudo do grego. Que bênção era estudar o grego bíblico com o Professor Arthur Kinsella! Com o Dr. Joseph Harry, autor de várias obras gregas, estudei também o grego clássico. Eu sabia que, se quisesse tornar-me clérigo presbiteriano, teria de dominar o grego bíblico. De modo que me empenhei furiosamente nisso e consegui as notas para passar.
Além de estudar grego e latim na escola, fiquei interessado em aprender espanhol, que eu achava bastante similar ao latim. Pouco eu sabia na época quanto usaria o espanhol no meu ministério cristão.
Um ponto alto na minha vida acadêmica surgiu quando o Dr. Lyon, reitor da universidade, anunciou perante uma assembléia de estudantes, no auditório, que eu havia sido escolhido para ir a Universidade Estadual de Ohio para exames competitivos com outros, para ganhar a Bolsa de Estudos Cecil Rhodes, a fim de me habilitar a cursar a Universidade de Oxford, na Inglaterra. Um dos concorrentes me ultrapassou com respeito ao atletismo em campo, mas, por causa das minhas notas comparáveis, queriam mandar a mim, junto com ele, à Universidade de Oxford. Gostei de que havia estado à altura dos requisitos para ganhar a bolsa de estudos, e, normalmente, isso teria sido muito satisfatório.
“Esta é a Verdade!”
Lembramo-nos de que Jesus Cristo, em certa ocasião, disse aos seus discípulos: “Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.” (João 8:32) No ano anterior 1913 meu irmão Albert conheceu “a verdade”, em Chicago. Como conheceu Albert “a verdade”?
Certa noite de sábado, na primavera de 1913, Albert fora dormir cedo no dormitório da ACM, onde morava enquanto trabalhava em Chicago. Mais tarde, seu colega de quarto entrou correndo para explicar uma dificuldade. Ele fora convidado naquela noitinha ao lar do senhor e da senhora Hindman, e a filha deles, Nora, teria ali uma amiga na casa. Duas moças seriam demais para o companheiro de Albert. Albert mostrou-se depressa à altura da ocasião. No decorrer da noitinha, o colega de quarto de Albert se dava muito bem com as duas moças. Mas o senhor e a senhora Hindmann se concentraram em Albert, familiarizando-o com os ensinos da Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados.
Albert enviou-me então um folheto intitulado Onde Estão os Mortos?, escrito por um médico escocês, John Edgar, membro da Congregação Glasgow dos Estudantes Internacionais da Bíblia. No começo, pus o folheto de lado. Daí, certa noitinha, dispondo de um pouco de tempo antes de ir ao ensaio de coro, comecei a lê-lo. Achei-o tão interessante, que não consegui largá-lo. Continuei a lê-lo enquanto caminhava cerca de um quilômetro e meio até a igreja presbiteriana. Visto que a porta da igreja ainda estava fechada sentei-me nos frios degraus de pedra e continuei lendo. O organista veio e, notando quão absorto eu estava no que lia, disse: “Deve ser algo interessante.” Respondi: “E é mesmo!”
Visto que eu gostava muito das novas verdades que aprendia, ocorreu-me perguntar ao pregador, Dr. Watson, o que ele achava deste folheto. Assim, naquela mesma noitinha, entreguei-lhe o folheto e perguntei: “Dr. Watson, o que sabe sobre isso?”
Ele pegou o folheto, abriu-o, e depois disse com desdém: “Ora, isto deve ser uma daquelas coisas de Russell. O que é que ele sabe sobre a escatologia?” Fiquei realmente chocado pela sua atitude de desprezo. Pegando o folheto de volta e virando-me, pensei: “Não me importo com o que acha disso. É a VERDADE!”
Não demorou muito, numa das suas visitas ao lar, Albert me trouxe os primeiros três volumes dos Estudos das Escrituras, escritos por Charles Taze Russell. Albert me apresentou também à congregação local dos Estudantes da Bíblia, que por acaso se reunia bem ao lado da igreja presbiteriana. Fiquei encantado com o que aprendia e logo decidi que chegara o tempo de cortar relações com a Igreja Presbiteriana.
Assim, mais tarde, quando Albert nos visitou de novo, fomos a uma das conferências de domingo à noite do Dr. Watson. Depois, Albert e eu fomos até o lugar onde ele apertava a mão dos paroquianos que saíam. Eu lhe disse: “Dr. Watson, estou deixando a igreja.”
Ele disse: “Eu o sabia! Eu o sabia! Assim que o vi lendo aquela coisa de Russell. Aquele homem, Russell, eu não lhe permitiria nem entrar pela minha porta!” Daí ele acrescentou: “Fred, não acha que devíamos ir à minha sacristia e orar juntos?” Eu lhe disse: “Não, Dr. Watson, eu já me decidi.”
Com isso, Albert e eu saímos da igreja. Quão gloriosa era a sensação de estar livre da servidão a um sistema religioso que ensinava falsidades! Quão bom era ser acolhido pela congregação dos Estudantes Internacionais da Bíblia, que eram tão leais à Palavra de Deus! Em 5 de abril de 1914, em Chicago, Illinois, simbolizei minha consagração — como chamávamos a dedicação — pelo batismo em água.
Nunca lamentei que, pouco antes do anúncio, pelas autoridades educativas, do resultado dos exames para a Bolsa de Estudos Cecil Rhodes, eu escrevi uma carta às autoridades, avisando-as de que havia perdido o interesse pela bolsa de estudos na Universidade de Oxford, e que deviam retirar meu nome da lista dos concorrentes. Fiz isso embora meu professor de grego, na universidade, o Dr. Joseph Harry, me informasse de que eu havia sido escolhido para receber a bolsa de estudos.
Dois meses depois, em 28 de junho de 1914, o assassinato do Arquiduque Ferdinando, da Áustria-Hungria, e da sua esposa ocorreu em Sarajevo, na Bósnia. Naquela mesma data, os Estudantes Internacionais da Bíblia estavam no terceiro dia de seu congresso geral no salão Memorial Hall, em Columbus, Ohio, EUA. Apenas um mês depois, ou em 28 de julho de 1914, irrompeu a primeira guerra mundial da história humana. Nós Estudantes da Bíblia esperávamos o fim dos Tempos dos Gentios, de 2.520 anos de duração, por volta de 1.º de outubro daquele ano.
Com a permissão de meu pai, eu deixara a Universidade de Cincinnati em maio de 1914, apenas poucas semanas antes do fim do meu terceiro ano ali como aluno. Contatei imediatamente a Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados (dos EUA) para me tornar colportor, ou pioneiro, como é chamado hoje o ministro de tempo integral. Nesta época eu já me associava ativamente com a Congregação Cincinnati dos Estudantes Internacionais da Bíblia.
Mais tarde, tornei-me ancião da Congregação Cincinnati. Assim, quando os Estados Unidos da América ficaram envolvidos na Primeira Guerra Mundial do lado dos Aliados, e os jovens foram recrutados para o exército, eu fui eximido por ser ministro do evangelho.
Fiquei Conhecendo o Irmão Russell
Entre os incidentes da minha vida de que me lembro com carinho está a ocasião em que travei conhecimento com o primeiro presidente da Sociedade, Charles Taze Russell. Conheci-o pessoalmente pela primeira vez no dia antes da primeira apresentação do Fotodrama da Criação, no Music Hall, no domingo, 4 de janeiro de 1914. Naquele sábado, um ancião da Congregação Cincinnati encontrou-se comigo fora do Music Hall e disse: “Escute, o irmão Russell está lá dentro, e se você for atrás do palco, poderá vê-lo.” Ansioso, fui e depois me vi falando com ele face a face. Ele viera para inspecionar os arranjos daquela apresentação inicial do Fotodrama da Criação.
Depois em 1916 ele estava baldeando de trem em Cincinnati, tendo de esperar ali algumas horas. Uma irmã e eu, quando soubemos disso, apressamo-nos a ir à estação da estrada de ferro, onde encontramos a ele e seu secretário. Ele trouxera consigo seu lanche, e na hora de comer, o repartiu conosco.
Terminado o lanche, perguntou se alguém tinha uma pergunta bíblica. Perguntei sobre a probabilidade de Adão ser ressuscitado, visto que era pecador impenitente, deliberado. Com um brilho nos olhos, ele respondeu: “Irmão, você está fazendo uma pergunta e ao mesmo tempo responde a ela. Agora, qual foi a sua pergunta?”
“O Mistério Consumado”
Na terça-feira, 31 de outubro de 1916, Charles Taze Russell faleceu, sem ter produzido o sétimo volume da sua série de Estudos das Escrituras. No leito de morte a bordo dum trem em viagem de retorno da Califórnia, quando perguntado pelo seu secretário sobre o sétimo volume, ele respondeu: “Outro vai ter que escrevê-lo.”
No ano seguinte, 1917, o sétimo volume apareceu como comentário sobre os livros proféticos de Ezequiel e Revelação, junto com uma bela explicação do livro bíblico de O Cântico de Salomão. A Sociedade planejava uma enorme divulgação do novo livro. Por isso enviou caixas deste sétimo volume a certas pessoas nas congregações em todos os Estados Unidos. Muitas caixas foram enviadas ao meu lar na Rua Baymiller, 1810, Cincinnati, Ohio, e guardadas ali à espera de instruções adicionais sobre como o conteúdo delas devia ser distribuído.
Havia oito páginas de O Mistério Consumado que continham citações de figuras de destaque, que se haviam expressado negativamente a respeito da guerra. Às instigações das organizações religiosas da cristandade, católicas e protestantes, o governo dos Estados Unidos levantou objeções, de modo que as páginas 247-54 foram cortadas do livro. Depois, quando O Mistério Consumado foi oferecido ao público, dava-se uma explicação sobre o motivo da falta dessas páginas. O governo dos Estados Unidos não ficou satisfeito com esta atuação, e sob instigações adicionais das organizações religiosas do país, proscreveu todo o sétimo volume dos Estudos das Escrituras.
Lembro-me de que, certa manhã de domingo, eu trabalhava perto da porta dos fundos da nossa casa. Vieram uns homens pelo passadiço junto à casa, e o líder deles puxou para trás a lapela de seu casaco, mostrou-me seu distintivo de metal e exigiu entrar na casa. Vi-me assim obrigado a levá-los para dentro e mostrar-lhes as caixas com os exemplares de O Mistério Consumado. Depois de alguns dias, mandaram um caminhão e as levaram todas.
Mais tarde soubemos que Joseph F. Rutherford, segundo presidente da Sociedade Torre de Vigia (dos EUA), e seis de seus colaboradores, que serviam na sede em Brooklyn, foram erroneamente condenados por interferência no esforço de guerra dos Estados Unidos. Foram sentenciados a 20 anos na Penitenciária Federal de Atlanta, por quatro enquadramentos em delitos, mas, com sentenças concomitantes. A guerra terminou em 11 de novembro de 1918, e então, em 25 de março de 1919, o irmão Rutherford e seus colaboradores foram soltos sob fiança. Mais tarde, foram completamente exonerados de culpa. O livro O Mistério Consumado também deixou de ser proscrito e foi autorizado a ser novamente divulgado livremente.
Quão reanimador foi para o nosso espírito quando a Sociedade programou nosso primeiro congresso de após-guerra em Cedar Point, na ponta duma península de veraneio, perto de Sandusky, Ohio, para 1.º a 8 de setembro de 1919! Para mim foi um privilégio muito alegre poder assistir àquele congresso.
Convidado a Betel
No ano seguinte, 1920, o Presidente Rutherford aceitou um convite de falar em público em Cincinnati, Ohio. Na época, eu fazia o serviço de colportor, e o irmão Rutherford convidou-me a escrever-lhe uma carta, candidatando-me ao serviço na sede no Betel em Brooklyn.
Enviei a carta, e depois de receber uma resposta favorável, tomei o trem para a cidade de Nova Iorque. Cheguei ali na noite de terça-feira, 1.º de junho de 1920, sendo esperado por Leo Pelle, antigo amigo de Louisville, Kentucky, que me levou ao lar de Betel. No dia seguinte, quarta-feira, designaram-me formalmente a ficar num quarto junto com Hugo Riemer e Clarence Beatty, no sótão, tornando-me o 102.º membro da família de Betel em Brooklyn.
A Sociedade estabelecera sua primeira gráfica na Avenida Myrtle, 35, onde se instalou no porão nossa primeira rotativa, chamada Encouraçado, por causa do seu tamanho. Imprimíamos a nova revista da Sociedade, intitulada A idade de Ouro — mais tarde chamada Consolação e agora Despertai!. Ao passo que as revistas subiam por uma abertura no piso e eram transportadas por um sistema de fios sobre uma prancha inclinada, eu as apanhava, ajeitava e empilhava para posterior apara e manejo.
Nas manhãs de sábado, quando a rotativa não imprimia revistas, vários de nós irmãos enrolávamos as revistas em papel marrom de embrulho, que continha o nome e o endereço dos assinantes. Daí fazíamos a selagem delas para o correio. Continuei a fazer este trabalho por vários meses, até que Donald Haslett, que servia no Departamento dos Colportores, partiu para se casar com Mabel Catel. Fui então transferido da Avenida Myrtle, 35, para o escritório da Sociedade na Columbia Heights, 124, para servir no Departamento dos Colportores.
Também, como membro da Congregação Nova Iorque, fui designado para dirigir um estudo de livro na casa da família Afterman, na região de Ridgewood, em Brooklyn.
Privilégios na Rádio e em Congressos
Continuei a servir no Departamento dos Colportores até 1926. No ínterim, a Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados (dos EUA) havia estabelecido em Staten Island sua primeira emissora de rádio, WBBR. Isto foi em 1924. Tive o alegre privilégio de servir nos programas da Sociedade, não só proferindo discursos, mas também cantando solos de tenor, e até mesmo tocando o bandolim ao acompanhamento de piano. Além disso, eu cantava como segundo tenor no quarteto masculino da nossa WBBR. Naturalmente, o irmão Rutherford, como presidente da Sociedade, era o orador de destaque da WBBR e tinha uma vasta audiência.
Foi no ano de 1922 que se realizou pela segunda vez em Cedar Point, Ohio, um congresso geral da Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados. Ali fomos fortemente exortados pelo irmão Rutherford: “Anunciem, anunciem, anunciem o Rei e seu reino!”
Um dos meus muito prezados privilégios na década de 20 foi o de servir junto com o irmão Rutherford no congresso internacional em Londres, Inglaterra, em 1926. Ele proferiu ali seu discurso público no Royal Albert Hall, de Londres, perante uma grande assistência, depois de eu ter cantado um solo de tenor, ao acompanhamento do famoso órgão do salão.
Na noite seguinte, ele falou a uma assistência judaica sobre “A Palestina Para os Judeus — Por Quê?”, e eu cantei um solo do Messias de Händel, “Consola-te, Meu Povo”. Vários milhares de judeus compareceram a esta reunião especial. Naquela época, aplicávamos erroneamente profecias das Escrituras Hebraicas aos judeus carnais, circuncisos. Mas, em 1932, Jeová abriu nossos olhos para ver que aquelas profecias se aplicam ao Israel espiritual.
E quão emocionante foi para mim estar no congresso de Columbus, Ohio, em 1931, quando o irmão Rutherford apresentou o ‘novo nome’, Testemunhas de Jeová, e todos nós o adotamos entusiasticamente! Logo em seguida, todas as congregações do povo de Jeová, em todo o globo, adotaram este “novo nome”. — Veja Isaías 62:2.
Na sexta-feira, 31 de maio de 1935, eu estava servindo como regente no fosso da orquestra, logo abaixo da tribuna do palco, da qual o irmão Rutherford proferiu seu discurso histórico sobre Revelação 7:9-17, identificando corretamente para nós os membros da “grande multidão” ali descrita. Convidou-se especialmente os da chamada classe de Jonadabe para estar presentes, e o motivo disso tornou-se evidente quando o irmão Rutherford mostrou que a “grande multidão” se compõe das “outras ovelhas” do “bom pastor”, Jesus Cristo. (João 10:14, 16, Rei Jaime, em inglês) Foi uma ocasião emocionante. Quão comovente era para mim quando no dia seguinte, sábado, 1.º de junho, 840 congressistas foram imersos em água para simbolizar sua dedicação a Deus, por meio de Cristo, visando um paraíso terrestre! Daí em diante, o número das “outras ovelhas” de Cristo passou a superar em muito o número minguante do “pequeno rebanho” dos discípulos gerados pelo espírito, semelhante a ovelhas, do Pastor Excelente, Jesus Cristo. — Lucas 12:32.
No entanto, quando irrompeu a Segunda Guerra Mundial, parecia que isto significava o fim do ajuntamento da “grande multidão”. Lembro-me de o irmão Rutherford dizer-me certo dia: “Bem, Fred, parece que a ‘grande multidão’, afinal, não vai ser tão grande assim.” Pouco nos dávamos conta do grande ajuntamento que ainda estava à frente.
A Sociedade introduziu em 1934 o fonógrafo portátil, e as gravações dos discursos do Presidente Rutherford eram usadas para apresentar a literatura bíblica. Quando saíram os seus discos traduzidos para o espanhol, concentrei-me em usá-los para contatar pessoas de língua espanhola na vizinhança de nossa gráfica na Rua Adams, 117. Daí, por meio de revisitas, ajudava os interessados a aprender as verdades bíblicas, e deste modo tive finalmente o privilégio de organizar a primeira congregação de língua espanhola em Brooklyn. Pertenço à Congregação Espanhola de Brooklyn, número um, desde que foi formada.
Mudanças na Presidência da Sociedade
Quando o irmão Rutherford faleceu em 8 de janeiro de 1942, foi sucedido por Nathan H. Knorr na presidência da Sociedade. Apesar do furor da Segunda Guerra Mundial, seu discurso público proferido no verão (setentrional) de 1942, sobre o assunto “Paz — Pode Durar?”, inverteu nossa perspectiva quanto ao futuro imediato. Pouco depois, o irmão Knorr abriu a Escola Bíblica de Gileade da Torre de Vigia, na Fazenda do Reino, na segunda-feira, 1.º de fevereiro de 1943, com cem alunos constituindo a primeira classe. Tive o privilégio de servir no programa da inauguração. Os irmãos Keller, Maxwell G. Friend, Victor Blackwell e Albert D. Schroeder serviram como instrutores.
No seu discurso de abertura, o irmão Knorr informou-nos que a Sociedade tinha dinheiro suficiente para manter a escola funcionando por cinco anos. Mas, eis que Jeová Deus, o Todo-poderoso, tem mantido a escola em funcionamento nove vezes tanto tempo!
Foi um enorme privilégio estar associado com Nathan H. Knorr. Pouco eu sabia que, quando ele foi imerso, depois do discurso que proferi para os batizandos, em 4 de julho de 1923, à beira do rio Little Lehigh, fora da sua cidade natal de Allentown, Pensilvânia, que ele se tornaria o terceiro presidente da Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados (dos EUA).
Sob a presidência do irmão Knorr, viajei extensamente, falando a grandes assistências de irmãos em todo o mundo — inclusive na América Latina e na Austrália — incentivando-os a permanecer fiéis. Numa destas ocasiões, em 1955, quando a obra das Testemunhas de Jeová estava proscrita na Espanha, servi uma assembléia secreta numa floresta fora de Barcelona. Nossa reunião de irmãos espanhóis foi cercada pela polícia secreta, armada, e os homens foram levados em caminhões para a chefatura da polícia. Ali ficamos detidos e fomos interrogados. Visto que eu era cidadão americano, fingi não entender espanhol. Também, duas irmãs haviam conseguido escapar e foram informar o Consulado Americano sobre a minha prisão, e este, por sua vez, entrou em contato com a polícia. Querendo evitar um incidente internacional e publicidade adversa, finalmente deixaram que nós estrangeiros fôssemos embora, e, mais tarde, também os outros irmãos. Depois, alguns de nós nos reunimos no lar dos irmãos Serrano e nos alegramos muito com a libertação que Jeová dera ao seu povo. Em 1970, a Espanha concedeu reconhecimento legal às Testemunhas de Jeová. Hoje temos uma congênere perto de Madri, e, no ano passado, a organização na Espanha incluía mais de 65.000 publicadores do Reino, havendo congregações em todo o país.
Em 8 de junho de 1977, faleceu Nathan H. Knorr, terminando sua carreira terrestre, e eu lhe sucedi no cargo de presidente da Sociedade. O irmão Knorr servira mais de 35 anos na presidência, mais tempo do que os dois presidentes precedentes da Sociedade, Russell e Rutherford. Como membro do Corpo Governante das Testemunhas de Jeová, recebi a designação de servir na Comissão Editora e na Comissão de Redação do Corpo Governante.
É de fato um grande privilégio e um grande prazer continuar a servir nos escritórios da Sociedade na Columbia Heights, 25. Isto requer uma caminhada regular, nos dias de trabalho, entre os escritórios gerais e o lar de Betel — um excelente exercício físico para um corpo envelhecido. Embora eu tenha 93 anos de idade e minha vista esteja falhando, sinto-me muito feliz de que Jeová me abençoou com boa saúde, a ponto de eu não perder nem sequer um dia de trabalho por motivo de doença, nos 66 anos em Betel, e ainda posso servir por tempo integral. Para mim tem sido deveras um favor divino estar aqui desde o ano de 1920, e presenciar o aumento e a expansão da organização na sede em Brooklyn e em todo o mundo.
Com plena confiança no Soberano Universal, Jeová Deus, e no seu Marechal-de-Campo, Jesus Cristo, que preside sobre as incontáveis multidões de serafins, querubins e santos anjos do céu, aguardo, na época de se escrever isso, junto com milhões de co-Testemunhas, o que a Bíblia mostra ainda estar à frente: a destruição de Babilônia, a Grande, o império mundial da religião falsa, e a guerra do grande dia de Deus, o Todo-poderoso, no Armagedom, culminando na vitória das vitórias por parte do Soberano Universal, Jeová Deus, que é “de eternidade a eternidade”. Aleluia! — Salmo 90:2, Almeida.
[Foto na página 24]
Na parte inferior do centro, com colegas de trabalho de Betel. 1920.
[Foto na página 25]
Com N. H. Knorr, 1961
[Foto na página 26]
Discursando num congresso no Japão. 1978