PERGUNTAS DOS LEITORES
No passado, nossas publicações muitas vezes mencionavam tipos e antítipos, mas nos últimos anos raramente têm feito isso. Por quê?
O livro Salvação, publicado em português em 1940, definiu desta forma “tipo” e “antítipo”: “O tipo é imagem ou representação de alguma coisa que [vai acontecer] em tempo futuro. O antítipo é a realidade da coisa da qual o tipo é representação. O tipo pode ser propriamente chamado ‘sombra’; o antítipo, a ‘realidade’.”
Muitos anos atrás, nossas publicações afirmaram que homens e mulheres fiéis, como Débora, Eliú, Jefté, Jó, Raabe, Rebeca e vários outros, eram na verdade tipos, ou sombras, dos ungidos ou da “grande multidão”. (Rev. 7:9) Por exemplo, pensava-se que Jefté, Jó e Rebeca representavam os ungidos, ao passo que Débora e Raabe simbolizavam a grande multidão. No entanto, em anos mais recentes, não temos feito comparações assim. Por que não?
As próprias Escrituras mostram que algumas pessoas serviram como tipos de algo maior. Em Gálatas 4:21-31, o apóstolo Paulo menciona “um drama simbólico” que envolvia duas mulheres. Agar, escrava de Abraão, representava ou correspondia ao Israel literal, que estava sujeito a Jeová por meio da Lei mosaica. Mas Sara, a mulher “livre”, simbolizava a esposa de Deus, a parte celestial da sua organização. Paulo, na carta aos hebreus, relaciona o rei-sacerdote Melquisedeque a Jesus, destacando pontos em comum entre os dois. (Heb. 6:20; 7:1-3) Além disso, Paulo compara Isaías e os filhos dele a Jesus e seus seguidores ungidos. (Heb. 2:13, 14) Paulo escreveu sob inspiração; assim, nós aceitamos, sem questionar, o que ele disse sobre esses símbolos.
No entanto, mesmo quando a Bíblia mostra que uma pessoa serve como tipo, ou símbolo, de outra, não devemos concluir que cada detalhe ou acontecimento na vida daquela pessoa representa algo maior. Por exemplo, embora Paulo tenha dito que Melquisedeque era um tipo profético de Jesus, ele não disse nada sobre a ocasião em que Melquisedeque trouxe pão e vinho para Abraão depois que ele derrotou quatro reis. Portanto, não há base bíblica para atribuir um significado oculto a esse acontecimento. — Gên. 14:1, 18.
Alguns escritores que viveram nos séculos seguintes à morte de Cristo caíram numa armadilha: eles viam tipos proféticos em tudo. Ao descrever os ensinamentos de Orígenes, Ambrósio e Jerônimo, a obra The International Standard Bible Encyclopedia (Enciclopédia Bíblica Padrão Internacional) explica: “Eles procuravam tipos, e logicamente os encontravam, em todos os acontecimentos registrados nas Escrituras, mesmo nas coisas mais banais. Eles pensavam que até a circunstância mais simples e comum escondia a verdade mais obscura . . . , até mesmo o número de peixes que os discípulos apanharam na noite em que o Salvador ressuscitado apareceu a eles. Quantas aplicações desse número, 153, alguns tentaram fazer!”
Agostinho de Hipona comentou extensivamente o relato de quando Jesus alimentou cerca de 5 mil homens com cinco pães de cevada e dois peixes. Visto que a cevada era considerada inferior ao trigo, Agostinho concluiu que os cinco pães certamente representavam os cinco livros de Moisés (a “cevada”, inferior, representava a suposta inferioridade do “Velho Testamento”). E os dois peixes? Por alguma razão, ele os comparou a um rei e um sacerdote. Outro erudito que gostava muito de tipos e antítipos viu um significado simbólico no ato de Jacó comprar a primogenitura de Esaú com uma tigela de ensopado vermelho. Para ele, isso representava o fato de Jesus ter comprado a herança celestial para a humanidade com o seu sangue vermelho.
Se essas interpretações parecem forçadas, você pode entender a dificuldade. Os humanos não podem saber quais relatos bíblicos são sombras de coisas futuras e quais não são. Qual é o melhor caminho a seguir? Quando as Escrituras dizem que uma pessoa, um acontecimento ou um objeto são tipos proféticos de outra coisa, nós aceitamos. Do contrário, devemos ter cautela ao dizer que certa pessoa ou relato são antítipos de algo, se não há base bíblica específica para isso.
Então, como podemos nos beneficiar dos acontecimentos e exemplos encontrados na Bíblia? Em Romanos 15:4, lemos as palavras do apóstolo Paulo: “Todas as coisas escritas outrora foram escritas para a nossa instrução, para que, por intermédio da nossa perseverança e por intermédio do consolo das Escrituras, tivéssemos esperança.” Paulo estava dizendo que seus irmãos ungidos do primeiro século podiam tirar lições importantes dos eventos registrados nas Escrituras. No entanto, o povo de Deus de todas as gerações, ungidos ou das “outras ovelhas”, quer vivessem nos “últimos dias” quer não, poderiam se beneficiar — e de fato têm se beneficiado — das lições ensinadas em “todas as coisas escritas outrora”. — João 10:16; 2 Tim. 3:1.
Em vez de aplicar a maioria desses relatos a uma única classe de pessoas e a um único período, todos os servos de Deus, ungidos ou da grande multidão, não importa em que época vivam, podem aplicar a si mesmos as muitas lições que os relatos ensinam. Por exemplo, não precisamos limitar a aplicação do livro de Jó às dificuldades que os ungidos enfrentaram durante a Primeira Guerra Mundial. Muitos servos de Deus, homens e mulheres, ungidos e da grande multidão, passaram por experiências como as de Jó e ‘viram o resultado que Jeová deu, que Jeová é mui terno em afeição e é misericordioso’. — Tia. 5:11.
Pense nisto: não é verdade que em nossas congregações hoje encontramos mulheres maduras tão fiéis como Débora, jovens anciãos tão sábios como Eliú, pioneiros corajosos tão zelosos como Jefté, e homens e mulheres fiéis tão pacientes como Jó? Como somos gratos de que Jeová preservou o registro de “todas as coisas escritas outrora” de modo que, “por intermédio do consolo das Escrituras, tivéssemos esperança”!
Assim, por esses motivos, nossas publicações nos últimos anos têm destacado as lições que podemos tirar dos relatos bíblicos, em vez de tentar encontrar padrões e aplicações de tipos e antítipos.