-
Jeová nenhum bem sonega aos seus servosA Sentinela — 1963 | 1.° de novembro
-
-
Jeová Nenhum Bem Sonega aos Seus Servos
Segundo narrado por WALLACE BAXTER
NO PENÚLTIMO dia do ano de 1896 nasceu um filho de Thomas e Mary Baxter. Poucos dias mais tarde, na Igreja Metodista Primitiva, em Greenock, Escócia, eu fui “batizado” e chamado de Wallace, segundo o nome de um dos lutadores escoceses pela liberdade.
Meu pai era um homem profundamente religioso, tendo um conceito amplo e liberal. O culto familiar era praticado todas as manhãs. Fazia-me lembrar com freqüência que Deus supre todas as nossas necessidades e minha mãe repetia as palavras afirmativas de um dos meus Salmos favoritos: Jeová “nenhum bem sonega aos que andam retamente”. (Sal. 84:11, ALA) Outra verdade que me impressionava grandemente era a declarada por Jesus, quando disse: “A vida de um homem não consiste na abundância dos bens que ele possui.” (Luc. 12:15, ALA) Deveras! Tendo eu as coisas necessárias da vida numa medida razoável e tendo todas as minhas faculdades, o que mais poderia eu usar, e de que valor me seriam as coisas, se eu as não pudesse usar?
O amor paternal escudou os dias de minha juventude, dirigindo e orientando-me, contudo, deixando-me liberdade considerável para escolher e agir. Eu tinha acesso a uma excelente biblioteca, abrangendo um amplo campo religioso e contendo muita literatura instrutiva. Parecia-me que a instrução baseada na verdade, sim, na Palavra de Deus, era a necessidade básica para todos, a fim de que a raça sobrevivesse. Eu sentia que o mundo estava mudando. Hipocrisia, frivolidade, imoralidade e egoísmo, aumentavam. Deveras, meditava eu, estamos nos últimos dias preditos na Bíblia. Freqüentava uma igreja após outra, esperando ouvir a mensagem tão urgentemente necessitada. Desiludido, passava então os domingos andando pelos matos e lendo a Bíblia. Com a Primeira Guerra Mundial atormentando Flandres e a apatia espiritual campeando entre o povo, convenci-me de que o duro proferimento do profeta Sofonias foi dirigido contra aqueles dias: “Está perto o grande dia do SENHOR [Jeová]; . . . é dia de indignação, . . . dia de nuvens e densas trevas.” — Sof. 1:14, 15, ALA.
NA GUERRA
Eu ouvi meu tio, um estudante da Bíblia, discutir o “Plano Divino” com meu pai, mas não lhe dei crédito. Logo fui convocado pelo exército e servi na França como telefonista de uma bateria de obuseiros. Um ou dois de meus companheiros aventuraram expressar a opinião de que toda a guerra está errada, mesmo que seja pelejada por nações “cristãs”. As cenas comoventes que vi no campo de batalha depois de um engajamento, convenceram-me de que eles estavam certos. Eu tivera uma vida bem protegida e então, felizmente, estava com um grupo de homens que me respeitavam a mim e aos meus pontos de vista. Muita coisa, porém, eu guardava para mim mesmo e achei ser grande companheira a Bíblia que minha mãe me dera.
Certa noite eu estava deitado no meu abrigo e um capelão do exército removeu um pedaço de ferro corrugado que servia de porta e rastejou-se para dentro, fumando um cigarro. Êle queria passar a noite. Respeitando seu santo ofício, desocupei com prazer o abrigo, esperando partilhar com ele o desjejum e receber dele alguma palavra espiritual. Fiquei terrivelmente desapontado. Bem cedinho ele se foi, deixando a “porta” aberta, as coisas em desordem e o chão cheio de pontas de cigarro. Eu estava enojado e com raiva ao passo que limpava o lugar. Fiquei imaginando como ele podia mostrar tanta falta de respeito ao ponto de usar a minha Bíblia como cinzeiro.
Poucos dias mais tarde recebi uma carta de meu irmão, que chamava minha atenção para a oração do Rei Salomão, segundo registrada em 2 Crônicas, capítulo 6. Sempre cri que os que sinceramente buscam a Deus, o encontram. Ponderando estas coisas, ajoelhei-me em meu abrigo e solenemente fiz um voto a Deus, que eu o serviria por toda a vida, se eu fosse poupado para voltar para casa.
A AURORA
Como milhares de homens na guerra, eu, diversas vezes, por pouco escapei da morte, mas a preservação de minha vida tinha um profundo significado especial para mim, o que a maioria dos outros não tinham. O 11 de novembro de 1918 trouxe o cessar fogo ao fronte ocidental e em inícios da primavera eu fui reabilitado. Propositadamente visitei meu tio, o estudante da Bíblia, que então morava em Edimburgo. Até bem mais de meia noite ele respondeu às minhas perguntas e me narrou o caminho de Deus à salvação. Pela noitinha seguinte eu já tinha lido, entendendo bem, um terço do livro do Pastor Russell, O Plano Divino das Eras. Era a verdade! Reconheci que as palavras de Jesus eram verdadeiras: Ninguém pode vir a mim se o Pai que me enviou não o trouxer.” (João 6:44, ALA) Tudo era tão maravilhoso! Animado pelo meu tio, busquei contato com um pequeno grupo de Estudantes da Bíblia, em Greenock. Sempre me recordarei do prazer de minha primeira reunião.
Empenhei-me então a ler os Estudos nas Escrituras e a revista A Sentinela, ficando completamente absorto nos interesses do Reino. Certo irmão espiritual que trabalhava no estaleiro local tornou-se valioso amigo e muitas noites passávamos horas escavando o tesouro precioso da Palavra, que nos pode ‘fazer sábios para a salvação, por intermédio da fé em conexão com Cristo Jesus’. (2 Tim. 3:15) Em fé, dediquei-me inteiramente a Jeová. Tive então o prazer de fazer a sua vontade. A oportunidade para me apresentar ao batismo em água surgiu num domingo de manhã, em setembro de 1921, durante uma assembléia em Glasgow.
O voto de servir a Deus permanece indelével no meu coração. Através dos anos continuei buscando a orientação de Jeová. Nas assembléias fiquei exultante com os muitos ardorosos discursos sobre as profecias de Isaías, capítulo 6; e ao “ouvir” a chamada de Jeová: “A quem enviarei, e quem há de ir por nós?” respondi: “Eis-me aqui, envia-me a mim.” (Isa. 6:8, ALA) Não só foi a chamada clara e irresistível, mas também, tendo-me dedicado, a Jeová, tive prazer em atendê-la. Serviço de tempo integral como pioneiro no campo foi a resposta. Nenhuma obrigação bíblica me impedia. Em prova disto, tirei umas férias em Ayrshire, pregando com dois “colportores” de tempo integral.
LEVANDO ESCLARECIMENTO ÀS ILHAS OCIDENTAIS
Um irmão local, que estava empregado nos correios e telégrafos, foi comigo ao testemunho pelas Hébridas Exteriores, uma cadeia de ilhas nuas, sem árvores e varridas pelo vento, que se estendem por uns 200 quilômetros ao noroeste da Escócia. A Sociedade Torre de Vigia nos designou para lá e vibrávamos com a perspectiva de levarmos esclarecimento aos pobres pescadores e tecelões de lã.
As minhas experiências durante os primeiros sete meses de pioneiro enriqueceram meu tesouro além do que o dinheiro pode comprar. Aprendi na prática que Deus “nenhum bem sonega aos que andam retamente”. (Sal. 84:11, ALA) Que “bem” receberia eu a seguir de Jeová? Mais trabalho como pioneiro!
Ao receber o relatório de que tínhamos coberto as Ilhas Ocidentais e também Skye, a Sociedade animou-nos a continuarmos o nosso bom trabalho nas ilhas Orkney e Shetland. Eu realmente apreciei trabalhar naquelas ilhas remotas e, certamente, Jeová não me sonegou bem algum. Até mesmo a oposição que defrontamos serviu para ensinar-nos. a usar a “espada do espírito” mais destramente. (Efé. 6:17) Dia após dia e por entre encantadoras flores silvestres, caminhávamos por todas as ilhas habitadas que podíamos alcançar, muitas vezes ficávamos na estrada até tarde da noite, pois o crepúsculo e a aurora eram iguais.
Foi naquele território que recebi um exemplar do primeiro Anuário publicado pela Sociedade Torre de Vigia. Uma dádiva de amor! Achei animadores e edificantes os textos diários e os comentários. Eram especialmente apreciados porque, onde estávamos, não havia reuniões congregacionais. Jeová, não me sonegou bem algum e, mediante a sua organização, atiçou meu zelo pela sua causa. Os relatórios de distantes países em volta da terra me fizeram vibrar. Li e reli o relatório da Estônia porque eu guardava o convite que a Sociedade me fez para trabalhar ali! A Estônia precisava de pioneiros! Fui aconselhado a principiar a estudar alemão; seria útil nos Estados Bálticos. As instruções para me dirigir para a Estônia chegaram a mim no outono de 1928, depois de ter trabalhado diversos meses na Irlanda. Era temo de partir para a Europa oriental!
NA ESTÔNIA
Depois de uma longa jornada, cheguei na cidade universitária de Tartu, na Estônia. Um irmão inglês me apresentou a uma dona de pensão alemã. Logo comecei a ficar à vontade em meu novo ambiente. Enquanto aprendia o idioma local e alemão, eu pedia aos moradores que lessem um cartão de testemunho escrito na língua deles, ou em alemão, ou em russo, antes de lhes oferecer literatura. Mais tarde trabalhei em Pernau e Talim, a capital da Estônia, onde se localizava o escritório-filial.
Em abril de 1930 fui designado servo da filial e, por dez anos, tive o privilégio de cooperar com os irmãos na pregação das verdades do Reino. As novas do Reino eram radiofonizadas por toda a Estônia, por sobre o mar, até à Finlândia e Suécia, e dentro da Rússia. Os russos e os clérigos da Estônia não gostavam. Vieram dias negros, quando liquidaram a nossa sociedade de dois anos e o escritório da Sociedade foi. tomado pela polícia. Confiscaram toda a literatura á mão. Não há dúvida de que prosseguimos com o trabalho e, pelas bênçãos de Jeová, aquele ano provou-se o mais produtivo.
Em 1938, o livro Riquezas e o folheto Escolhendo foram amplamente distribuídos antes de o estoque restante ser confiscado. Então, só duas espécies de folhetos em estoniano foram deixados para a distribuição. Todavia, o nosso tradutor e as impressoras da Sociedade em Berna, Suíça, estavam ocupados e nós recebemos o livro Inimigos, pouco antes de a guerra impedir a importação. As forças políticas e militares russas ocupavam então o país. Isto trouxe extensas e rápidas mudanças. Quando me encontrei com os estonianos pela primeira vez, êles eram inteligentes e alegres, mas a invasão russa lhes tinha mudado o semblante. Prevalecia uma deprimente atmosfera de temor.
SOB DIREÇÃO TEOCRÁTICA
O cônsul britânico em Talim instou para que todos os cidadãos com passaporte britânico deixassem os Estados Bálticos. Eu não tinha intenção de abandonar o meu posto e assim lhe expressei. Todavia, em 18 de outubro de 1940, cerca de dez dias antes de os evacuados britânicos partirem de Riga, Letônia eu recebi instruções do presidente da Sociedade para deixar a Estônia e ir para um país onde se falasse inglês. Informei imediatamente o cônsul referente à minha mudança de planos e me tornei um dos aproximadamente duzentos refugiados que foram enviados para um destino então desconhecido.
Eu fiz muitas despedidas, mas nenhuma tão comovedora como quando deixei os irmãos estonianos. Muitas vezes eu tinha imaginado como e quando as boas novas do reino de Deus entrariam na Rússia. Nunca me ocorreu que aquilo que fazíamos nos Estados Bálticos estava colocando sólida base para futura expansão em um imenso país, onde a necessidade era e ainda é grande. Estou convencido de que muitos daqueles queridos irmãos e irmãs têm estado a pregar e a ensinar eficientemente as boas novas do reino de Jeová na Rússia e, talvez, na Sibéria.
Viajei de Riga e atravessei a Rússia até ao porto de Vladivostok. Por todos os cansativos, contudo, interessantes onze dias de viagem de trem, observei igrejas queimadas e filas de camponeses esperando por pão. Em Chita, na sala de espera da estrada de ferro, eu vi o que podia ser um modelo vivo do quadro “Refugiados”, de Hubert von Herkomer, segundo aparece no livro Criação. Todavia, à cena visual deve-se acrescentar a fedentina que subia da imunda massa humana apinhada no cômodo mal-arejado. Por fim, tomamos o navio Hai Tan em Vladivostok e descobrimos que íamos para a Austrália, Um sentimento de alívio caiu sobre nós, ao passo que Vladivostok desaparecia no horizonte com o sol a se pôr. Em Honguecongue, vi pela primeira vez o Oriente com suas condições pavorosas e orei sinceramente no coração: “Venha o teu reino.” (Mat. 6:10, ALA) Em princípios de dezembro de 1940, cheguei à filial da Sociedade na Austrália. Os irmãos foram mui bondosos e me fizeram ficar à vontade.
Pouco depois de minha chegada a Strathfield, Jeová permitiu a seus inimigos banirem suas testemunhas, deixando que ocupassem a propriedade delas. O trabalho de testemunho naturalmente continuou, mais ou menos às ocultas. Eu participei em mimeografar a Sentinela e em distribuí-la aos irmãos. Nenhuma edição falhou, provando assim que Jeová nenhum bem sonega aos seus servos. Durante a proscrição eu trabalhei no depósito da Sociedade em Brisbane. Depois da proscrição, trabalhei em posto similar em Melbourne. Em 1948, fui chamado de volta ao lar de Betel em Strathfield e trabalho aqui até hoje.
Desde quando Jeová me aceitou em seu serviço, jamais me faltou coisa alguma, espiritual nem temporal! Depois de tantas viagens, de experiências variadas e de oportunidades para melhoramento neste mundo (e houve bastantes), o grosso de minhas ambições é encontrar-me no serviço de tempo integral de Jeová. “Porque o SENHOR [Jeová] Deus é sol e escudo, o SENHOR [Jeová] dá graça e glória, nenhum bem sonega aos que andam retamente. O SENHOR [Jeová] dos Exércitos, feliz o homem que em ti confia.” — Sal. 84:11, 12, ALA.
-
-
Carta dum clérigo liberianoA Sentinela — 1963 | 1.° de novembro
-
-
Carta dum Clérigo Liberiano
A seguinte carta foi recebida dum clérigo na Libéria: “Encontrei um dos seus livros chamado: ‘A Verdade Vos Tornará Livres’. Tendo-o lido, quero estudá-lo. Fui ordenado há cinco anos atrás na Igreja Protestante Episcopal. Confesso que nunca em toda a vida vi um livro que brilhava com tanta luz.” — Anuário de 1963, em inglês.
-