Como advogado, submeti Deus à prova
MEUS pais davam grande valor à educação. Assim, apesar da carga financeira, enviaram todos nós, seus oito filhos, a escolas católicas.
Toda noite, no mês de maio, nossa família rezava o Rosário. Ocasionalmente, neste mês de especial devoção católica à mãe de Jesus, eu e meu irmão montávamos em casa um pequeno altar, com flores e a imagem de Maria.
Diariamente, na Quaresma, todos nos levantávamos às seis horas para assistir à Missa. Num certo verão, quando servia de coroinha, eu ajudava a rezar duas ou três Missas num dia. Até mesmo cheguei a pensar em ser padre.
Surgem Dúvidas
As coisas mudaram, contudo. Na escola secundária fiquei bastante envolvido no atletismo, levando a uma bolsa como jogador de futebol americano que ajudou até financiar todos os meus estudos na universidade. Foi também na escola secundária que comecei a ter dúvidas quanto à minha religião. Lembro-me de uma aula dada por um padre. Partimos da premissa de que Deus não existia, e o alvo era concluir que existe definitivamente um Deus onipotente. O problema era que, a meio caminho da discussão, o sacerdote não conseguiu lidar com nossas perguntas sobre a evolução. Foi embaraçoso vê-lo também atrapalhar-se com perguntas tais como: “Por que o chamamos de padre (pai), quando Jesus disse que não devíamos chamar a ninguém de pai?” — Mateus 23:9.
Nessa ocasião, tentei vencer minhas dúvidas e continuei orando e assistindo à Missa. Mas quando minha bolsa de estudos me levou à Universidade de Washington, as coisas pioraram. Como no caso de muitos atletas estudantes, minha adoração logo se tornou totalmente egoísta. Antes de cada partida, eu assistia à Missa e orava pedindo a vitória. Depois da partida, eu me esquecia de Deus, enquanto festejava com meus colegas de equipe. A Guerra do Vietnã estava sendo travada, também, fazendo com que eu questionasse o modo como as coisas eram feitas. Por volta de meu último ano da faculdade, eu fumava maconha todo dia.
Sentindo-nos Deslocados
Em seguida, em 1968, fui cursar a Faculdade de Direito na Universidade Católica de San Diego. Ali tentei fazer um trato com Deus. Eu achava que, se assistisse à Missa, podia ter certeza de que Ele me faria tirar boas notas. No primeiro semestre conheci Melinda; no verão setentrional seguinte nós nos casamos. No dia depois de nosso casamento, levantamo-nos para assistir à Missa, mas chegamos um pouco tarde. Depois de ficarmos em pé por algum tempo na parte de trás da igreja, olhamos ao redor, e, então, um para o outro. Simplesmente nos sentimos deslocados. Saímos dali, para jamais assistir a outra Missa.
Quando nasceu Joshua, nosso primeiro filho, uns dois anos depois, eu praticava advocacia junto com um grupo de advogados que defendiam pessoas pobres, acusadas de terem cometido crimes federais. Para mim, este parecia um emprego perfeito, pois me tinha tornado uma espécie de radical, devido à inquietação causada pela guerra do Vietnã. Achava que conseguiria frustrar um governo corrupto por obrigá-lo a empregar dinheiro com tribunais de justiça. Ao mesmo tempo, estaria ajudando as pessoas.
Uma Babá Tem as Respostas
Fui certa vez nomeado defensor de um senhor que estava sendo processado por não servir nas forças militares. Acontece que ele era Testemunha de Jeová, e estava decidido a não matar outros, mas, em vez disso, buscar o caminho da paz. (Isaías 2:4) As explicações dele e as publicações que me ofereceu não me causaram nenhuma impressão profunda. De uma fonte diferente, porém, surgiu de novo o assunto. Melinda empregava uma babá que era Testemunha. Isto se tornou significativo quando Melinda vacilava diante das perguntas simples de nosso filho, Joshua, sobre Deus.
Melinda era de formação católica, e cursara uma universidade dirigida por jesuítas. Mesmo assim, perdera a fé em Deus. Com efeito, durante umas férias em Roma, ela orou para que, se pudesse ver o papa, isto certamente lhe restauraria a fé. Ela deveras o viu, sendo carregado nos ombros de outros homens. Em vez de isso edificar-lhe a fé, convenceu-a de que este não era o modo simples de agir de Jesus.
É fácil entender, então, por que Melinda vacilava diante das perguntas de Joshua. Ficava contente, contudo, de encontrar respostas satisfatórias no livro Escute o Grande Instrutor, obtido da babá. Mais tarde, ela reencontrou uma antiga conhecida da escola secundária que agora era Testemunha. Melinda lhe perguntou: “Como foi possível você se tornar Testemunha de Jeová, e como pode crer na Bíblia? Ela é tão contraditória!” De forma sábia, a Testemunha perguntou a Melinda se ela tinha lido alguma vez a Bíblia toda. A resposta de Melinda: “Não”, abriu caminho para uma visita e um estudo bíblico regular com ela.
Reinquirição Sobre a Bíblia
Eu disse a Melinda que ela poderia continuar com seu estudo bíblico conquanto ninguém me amolasse. Meses depois, conheci o casal que dirigia o estudo, mas tratei-os de forma muito rude. Em resposta à pergunta de Melinda: “Por que fez isso?”, disse-lhe: “Eles não eram gente. Eram Testemunhas de Jeová!” Isso levou a um transtorno muito grande em nossa família. Por fim, em desespero de causa, eu lhe disse: “Convide as Testemunhas para vir aqui em casa. Eu serei bonzinho com elas, e lhe mostrarei quão tola você está sendo em estudar a Bíblia.”
O casal de Testemunhas, Dan e Sharon, chegaram e, usando apenas a Bíblia, agüentaram minha intensa reinquirição. Fiquei frustrado de ver que Dan parecia ter uma resposta bíblica para todo problema que eu suscitava. Realizamos três destas sessões parecidas com um julgamento. Por fim, Dan inclinou-se para trás na cadeira e disse: “Sabe de uma coisa, eu realmente gosto de você.” Isso acabou com aquela atmosfera hostil. Na resultante atmosfera descontraída, Dan me mostrou uma maravilhosa profecia que se encontra em Daniel, capítulo 9, sobre a vinda do Messias. Fiquei tão impressionado que fiquei irado — não com ele, mas com a formação religiosa que eu tinha tido, que fora tão superficial.
Através do estudo desta e de outras profecias bíblicas, minha atitude para com as Escrituras mudou rapidamente. Comecei a pensar que minha própria rebeldia contra o governo humano, e meu consumo de tóxicos, talvez não refletissem um coração ruim, e sim uma reação para com um sistema que precisava ser substituído pelo governo do Reino de Deus.
Meu Problema com Tóxicos
Eu apreciava imensamente meu estudo bíblico mediante o livro A Verdade Que Conduz à Vida Eterna. Todavia, ainda fumava maconha, raciocinando: ‘Se consegui cursar a Faculdade de Direito sob tal influência, por certo posso aprender a Bíblia do mesmo modo.’ Assisti a algumas reuniões no Salão do Reino, mas não queria prosseguir, visto que já estava saturado de aulas, depois de 19 anos de escolaridade.
Concordei em assistir a um estudo menor, e mais informal, no meio da semana, junto com minha esposa. Nas primeiras três semanas, cada vez que me aprontava para deixar o escritório, aparecia um cliente e me oferecia um pouco de potente maconha. Depois de fumá-la, certamente não estava em condições de assistir a uma reunião cristã. Assim, telefonava para Melinda, e lhe dizia para ir sem mim. Por fim, ela me perguntou: “Não sabe quem é que está lhe causando isto? ” Isto me fez encarar algo em que não tinha pensado. Não gostava que me usassem, e especialmente de ser usado pelo Diabo. Na semana seguinte, a mesma espécie de tentação surgiu no escritório, mas eu recusei a maconha.
‘Será’, pensei comigo mesmo, ‘que fumar maconha é um obstáculo maior do que eu imagino?’ Quando nossa família tirou uns dez dias de férias, decidi pôr Jeová à prova, por assim dizer. Com a ajuda dele, não consumiria nenhuma maconha nesse período. Era surpreendente ver quão bem me sentia ao voltar. Também, nosso estudo da Bíblia, em cada dia da viagem, convenceu-me mais do que nunca sobre a verdade da Palavra de Deus. Que bênção maravilhosa foi essa viagem!
Lembro-me da primeira reunião depois disso. Em vez de ser um observador indiferente, era um participante ativo. Quão emocionada ficou Melinda de ver minha diferença de personalidade! Logo estávamos substituindo velhos amigos e colegas consumidores de tóxicos por amizades calorosas e limpas dentre as Testemunhas.
Minha Carreira Jurídica — Uma Prova
Em 1975, eu e Melinda simbolizamos nossa dedicação a Jeová Deus pelo batismo em água. Mais tarde, nesse mesmo ano, nasceu Jesse, nosso segundo filho. Certamente parecia que eu estava tendo a bênção de Jeová. Minha função de advogado criminalista, contudo, exigia muitas viagens a cidades distantes, representando ausências do convívio da família e da congregação. Comecei a não gostar dessa rotina, à medida que foi aumentando meu amor pelo ministério cristão.
Numa viagem, conheci diversas co-Testemunhas que eram advogados e médicos. Dois deles, em especial, me impressionaram, pois eram homens dedicados, que, embora fossem advogados, tinham gastado anos no serviço de tempo integral a Jeová Deus. Isso suscitou em mim o desejo de empregar minha perícia jurídica para defender o povo de Deus e para servir a Ele de forma maior. Um grande passo nesse sentido foi quando comecei a dedicar 60 horas por mês ao ministério cristão. Por diversos anos, fiz isto, deixando de fazê-lo apenas num mês, quando nasceu nosso terceiro filho, Ryan.
Certo dia, um ancião de nossa congregação mencionou a possibilidade de eu me tornar um ministro de tempo integral. “Não existe jeito de eu fazer mais do que já estou fazendo”, respondi, “tendo de cuidar de meus negócios e de minha família”. Mas, nos dias que se seguiram, assolou-me a indagação: ‘Realmente, por que não posso estar no ministério de tempo integral?’ Considerei o assunto em oração a Jeová, tendo em mente suas palavras em Malaquias 3:10, onde ele convida os humanos a colocá-lo à prova e ver se Ele não os abençoará.
Três Obstáculos a Transpor
Analisando minha situação, parecia que eu tinha três obstáculos para entrar no ministério de tempo integral. Certamente precisaria de alguma segurança financeira para compensar a perda de renda, se reduzisse o exercício da advocacia. Assim, a barreira número um era que eu possuía uma casa para vender. Junto com ela, havia a barreira número dois. Uma co-Testemunha morava na casa, e eu não queria obrigá-lo a mudar-se. A terceira barreira era que eu tinha sócios na minha banca de advocacia.
Orei a Deus: “Se o Senhor me quer no ministério de tempo integral, ajude-me a vender esta casa sem causar problemas à minha co-Testemunha, e ajude-me a pôr fim à sociedade em minha banca de advocacia. Se eu conseguir estas três coisas, entrarei nas fileiras de tempo integral.” Cerca de uma semana depois, aquela Testemunha me trouxe notícias espantosas. Disse-me que esperava que eu não ficasse aborrecido, mas que ele teria de mudar-se porque tinha conseguido um emprego em outra cidade!
No dia da mudança dele, fui até lá de carro para ajudá-lo a embalar tudo. No caminho, passei numa loja de ferragens e comprei pequena placa que dizia “Vende-se”. Depois de termos carregado seu caminhão, coloquei a placa na janela da frente, e tranquei a porta. Quando cheguei a casa, Melinda me disse que uma senhora tinha telefonado e deixado seu número de telefone. Telefonando para ela, fiquei pasmo quando ela me disse que ‘simplesmente tinha de comprar aquela casa’. De que casa estava falando? Ela contou que, antes de se casar, dissera ao seu futuro marido que só se casaria com ele se ele prometesse que, se a casa de seus sonhos surgisse no mercado, ele a compraria para ela. Ela queria dizer a casa que eu desejava então vender. Naturalmente, eu lhe disse que poderia comprá-la!
Logo depois disso, um dos meus sócios na banca de advocacia me contou a sua decisão de assumir outro emprego, e, assim, de dissolver nossa sociedade. Mal pude esperar chegar a casa para contar a Melinda e a meus filhos o que Jeová tinha feito. Todos concordaram que seria ótimo se eu iniciasse o ministério de tempo integral, o que fiz, em junho de 1979.
Tem Ele Abençoado Nossa Família?
Em setembro de 1979, fui designado superintendente em nossa congregação. Melinda participou em atividades aumentadas durante muitos meses, e agora é minha companheira no ministério de tempo integral. Nossos três filhos, também, estão ativos na obra de pregação cristã e nos trazem grande alegria. Com a ajuda da Palavra e da congregação de Deus, eu e Melinda temos aprendido a ser pais melhores, e isto tem resultado numa bênção para nossos filhos.
Há mais de um ano recebi outra bênção, quando aceitei ir à sede da Sociedade Torre de Vigia (EUA), em Nova Iorque, para fazer serviços temporários na construção ali realizada. Os primeiros dois dias de trabalhos braçais foram uma experiência diferente para mim. Daí, abriu-se uma oportunidade especial, graças a uma necessidade temporária de assistência jurídica adicional na sede, e apreciei ser útil nisso.
Já me acho de novo em San Diego, e devo dizer que, para mim, as maiores bênçãos e alegrias advêm da obra diária de pregação. Por exemplo, um dia bati à porta dum senhor mas ele bruscamente me mandou embora. Dirigi-me aos moradores dos outros apartamentos do conjunto. Ao sair do prédio, esse mesmo senhor também saiu e me pediu que entrasse. Ali, disse-me que, na realidade, estava orando a Deus para que lhe mandasse alguma ajuda quanto à sua vida, que era uma confusão só. Quando bati à porta, isso o deixou transtornado, porque perturbou a oração dele. Depois de me ter rejeitado, compreendeu que, talvez, minha visita fosse a resposta à sua oração. “Assim”, disse ele, “seja lá o que for que veio me dizer, sei que devo ouvir”. Ele ouviu e, depois de estudar a Bíblia por um ano, tornou-se um ministro batizado.
Para mim tem sido uma bênção especial responder às consultas feitas por aqueles que estão nas cadeias locais. Dirigir estudos bíblicos com detentos da cadeia do condado de San Diego, bem como com muitos outros que encontro em meu ministério, tem-me mantido bastante atarefado. Às vezes tenho de fazer ajustes na minha banca de advocacia e na minha carreira, como ministro de tempo integral. Geralmente, contudo, consigo programar minha presença no tribunal para a parte inicial da manhã, e ainda disponho da maior parte da manhã para o ministério de campo. As horas em que trabalho no escritório são na parte da tarde. No final da tarde e no início da noite, consigo retornar ao ministério e às minhas atividades de estudos bíblicos.
Quando reflito na direção que minha vida poderia ter tomado devido ao consumo de tóxicos e minha atitude de rebeldia, posso deveras sentir apreço pelo modo como Jeová me tem abençoado, atraindo-me para um relacionamento com ele e com a congregação cristã. Sem a Sua bênção, sei que não poderia ter a vida familiar feliz que desfruto agora, além de ser parte duma associação cristã mundialmente unida. Gostaria de assegurar-lhe de todo o coração que, se puser Jeová à prova, Ele lhe derramará uma bênção até que não haja mais necessidade. — Conforme narrado por Jim McCabe.
[Destaque na página 12]
‘Será’, pensei comigo mesmo, ‘que fumar maconha é um obstáculo maior do que eu imagino?’
[Foto na página 9]
Estudo a Bíblia com presidiários.
[Tradução: Prisão de SD (San Diego)]
[Foto na página 10]
Nossos filhos apreciam participar na adoração junto conosco.