Peru
Terra dos Incas. Isto é o Peru, outrora domínio do Império dos Incas. Hoje conta com uns 17.000.000 de habitantes, entre tais acham-se os índios quíchuas, cujos antepassados fundaram a muito desenvolvida civilização inca de há mais de sete séculos.
De cada 100 peruanos hoje, aproximadamente 46 são índios quíchuas ou aimarás. Na maioria, o resto da população é uma mistura de índios e brancos. Na realidade, as elevadas cordilheiras dos Andes, que dividem o país numa região árida costeira a oeste e numa luxuriante selva quente e úmida a leste, têm muito que ver com os grupos étnicos dos habitantes do Peru. Nas áreas das selvas há dezenas de tribos de índios que têm costumes e línguas bastante diferentes dos índios do “altiplano” que vivem nas grandes alturas dos Andes. Ao longo dos 2.300 quilômetros da região litorânea do Pacífico acha-se a maior parte dos residentes espanhóis do Peru, e muitos deles se misturaram com os nativos do país.
O Peru limita-se ao norte com o Equador e a Colômbia. A leste ficam o Brasil e a Bolívia, e ao sul acha-se o Chile.
Foi a este país, a antiga Terra dos Incas, que o conquistador espanhol, Francisco Pizarro, chegou no século dezesseis E. C. Havia sacerdotes e frades da Espanha que o acompanhavam em 1535. Para que essa recém-introduzida religião católica “pegasse”, os sacerdotes acharam conveniente adotar muitas tradições, costumes e idéias dos índios. Nunca a Igreja Católica no Peru desarraigou totalmente as práticas seculares dos descendentes dos incas que eram adoradores do sol. Por conseguinte, o espiritismo, o animismo e a adoração dos mortos foram cobertos levemente de um verniz de catolicismo, e o Peru dos dias atuais é um país de diferentes religiões amalgamadas. Mas a luz espiritual resplandece por todas as colinas, os montes e os vales desta antiga Terra dos Incas. (Sal. 43:3) Como teve início esse grande desenvolvimento?
COMEÇA A BRILHAR A LUZ ESPIRITUAL
Na década de 1930, testemunhas itinerantes de Jeová passaram pelo Peru e deixaram literatura bíblica cá e acolá. Também, Testemunhas de outros países enviaram amorosamente publicações cristãs a seus parentes neste país, instando que examinassem as páginas da palavra de Deus. Com o tempo, algumas dessas publicações foram parar em diversas livrarias de publicações usadas, de Lima, a capital.
Foi numa dessas livrarias que Victor Lura encontrou em 1938 um livro intitulado “A Harpa de Deus”. Esse título o fascinou! “É possível Deus ter uma harpa? Na verdade, de que harpa se trata?”, perguntou-se o Sr. Lura meditando. Comprou o livro por um preço insignificante, e o “devorou” imediatamente. Qual linda melodia tocada numa harpa de dez cordas, o recém-adquirido livro proporcionou muita alegria a seu leitor, visto que expunha claramente dez ensinamentos fundamentais das Escrituras Sagradas. Como essas verdades eram diferentes da doutrina católica e de sua própria crença pentecostal!
O Sr. Lura retornou depressa à livraria e procurou cuidadosamente mais publicações da Sociedade Torre de Vigia. Encontrou diversas delas. Naquele tempo, ele era o zelador do lugar de reuniões dos pentecostais naquela localidade. Com o passar dos meses, o Sr. Lura se sentiu impelido a copiar trechos desses valiosos livros que desmascaravam a evolução e o espiritismo. Cheio de zelo, mandou imprimir esses trechos, às suas próprias custas, na forma de tratados. Estes foram parar nas mãos de muitos residentes de Lima e da vizinha Callao. Naquele tempo, o Sr. Lura conheceu uma jovem, Lastenia Casana, que freqüentava também as reuniões pentecostais. Em 1939, eles se casaram e juntos estudaram atentamente as profecias da Bíblia tão claramente expostas nas publicações cristãs que ambos apreciavam muitíssimo.
Certo dia, em 1943, Victor voltou apressadamente para casa com uma notícia eletrizante. “Há uma Testemunha de Jeová na cidade”, disse todo emocionado à sua esposa. Freida Johnson, uma proclamadora do Reino por tempo integral, em viagem ao longo da costa ocidental da América do Sul, havia feito uma parada em Lima. Ela dera testemunho a uma senhora evangélica que, bondosamente, ofereceu acomodações para a irmã Johnson em sua casa que ficava quase no cume de uma grande colina no limite da cidade. A casa não tinha instalações sanitárias, nem água encanada, e as paredes eram só de esteiras de palha. Mas era o suficiente. Nossa intrépida pioneira embora na casa dos sessenta anos, tomava seu banho no rio Rimac como os residentes locais.
Sem demora, Victor Lura teve uma entrevista com a irmã Johnson. Por fim entrava em contato com o próprio povo de Jeová! Programou-se uma reunião naquela noitinha, e amigos e vizinhos foram convidados a assistir. Aquela primeira reunião não teve muito êxito. Na maioria, os que estavam presentes eram pentecostais e não deixavam a irmã Johnson falar, interrompendo-a continuamente com suas próprias frases religiosas favoritas. Portanto, só foram convidados para a reunião da noite seguinte os que manifestaram real interesse na verdade bíblica. Nessa reunião, a irmã Johnson deu um testemunho conciso e explícito, referindo-se repetidas vezes ao assunto sobre o estabelecimento do reino de Deus nos céus em 1914. Diversos ouvintes se convenceram disso. Achavam-se entre eles Pedro Garay e Victor Romero.
A irmã Johnson permaneceu em Lima quatro dias, que passou dando testemunho aos recém-interessados e encorajando-os. Cumprindo a sua comissão cristã, ela enviou o nome e endereço dessas pessoas à sede da Sociedade Torre de Vigia em Brooklyn, Nova Iorque. Daí, partiu para Huancayo, no centro do Peru, e de lá foi em direção ao sul. As Testemunhas peruanas ficaram sabendo mais tarde que a irmã Johnson morreu em Medellin, na Colômbia, por volta de 1945, de uma crise de malária.
Victor Lura, Pedro Garay e Victor Romero ajuntaram US$ 20,00 (cerca de Cr$ 600,00) que enviaram à Sociedade Torre de Vigia em Brooklyn. Desejavam ansiosamente obter informações sobre o que podiam fazer para divulgar as “boas novas”. Apenas um mês depois, receberam publicações, bem como um fonógrafo e discursos bíblicos, gravados, em espanhol. De quando em quando, chegavam-lhes cartas e instruções. Embora fossem em inglês, Victor Romero conhecia o idioma e as traduzia. Portanto, foi assim que em 1943 e 1944 a luz espiritual começou a brilhar sobre a antiga Terra dos Incas.
COMUNICAÇÃO QUE EDIFICA ESPIRITUALMENTE
Numa de suas cartas, Victor Lura perguntou à Sociedade se esta podia enviar ajuda a Lima. A resposta emocionante foi que realmente estavam sendo preparados missionários para irem como testemunhas “até à parte mais distante da terra”. (Atos 1:8) Assim, alimentou-se a esperança da chegada eventual ao Peru de missionários treinados na Escola Bíblica de Gileade da Torre de Vigia. Com efeito, em 10 de junho de 1944, N. H. Knorr, presidente da Sociedade Torre de Vigia, convocou para seu escritório sete missionários a fim de lhes dizer que seriam designados para o Peru.
Mas algo muito importante ocorreria antes da chegada desses missionários. O pequeno grupo em Lima ficou sabendo que os irmãos N. H. Knorr e F. W. Franz lhe fariam uma visita em 26 de fevereiro de 1945. Que alegria foi pensar ter comunicação com a organização de Jeová mediante associação com esses irmãos!
Chegou por fim o muito esperado dia. Cinco alegres irmãos e pessoas interessadas estavam no aeroporto de Lima, acenando entusiasticamente com a Atalaya (a edição em espanhol de A Sentinela) à medida que o avião, troando, terminava seu pouso. Logo houve caloroso intercâmbio de cumprimentos enquanto os visitantes e os peruanos aguardavam a alegria de se reunir na casa de Victor Lura.
Naquela noitinha, oito rostos atentos estavam virados para o orador, o irmão Knorr, que delineava as grandes responsabilidades que recaiam sobre os que desejavam servir a Jeová Deus. Falou primeiro sobre a necessidade de realizarem reuniões cristãs regularmente. Mencionou o problema que representava a entrada de missionários no Peru. Isto não seria fácil, visto que o país tinha concordata com o Vaticano. Outrossim, o presidente do Peru havia decretado que, exceto o catolicismo romano, nenhuma organização tinha autorização de realizar cultos religiosos em público. Qual seria a penalidade pela desobediência? A penalidade prevista era de dois a 30 dias de reclusão e uma multa de dois a 50 soles, ou uma das duas. Mas o que pensavam os ouvintes do irmão Knorr sobre tudo isso? Eles eram destemidos e estavam decididos a difundir a mensagem do Reino de casa em casa. Foi com esse espírito que se encerrou a reunião.
Após uma viagem até o sul, os visitantes retornaram a Lima em 26 de março. Dezoito pessoas estavam presentes naquela noite no local de reunião, quatro dos quais sendo os dois viajantes de Brooklyn e os irmãos Albert Mann e Jack Powers, diplomados da Escola de Gileade, que estavam fazendo uma breve parada em Lima antes de irem para suas designações no sul. Usando o irmão Franz como intérprete do inglês para o espanhol, o irmão Knorr destacou a importância de fazer revisitas. Falou também sobre a possibilidade de formar uma congregação local das Testemunhas de Jeová. Era este o desejo das pessoas novas ali? Certamente! Também, diversos dos que estavam presentes expressaram o desejo de serem batizados em símbolo de sua “consagração” ou dedicação a Jeová. Providenciou-se que os irmãos Mann e Powers voltassem na noite seguinte para outra reunião e que voltassem também na noite após essa para a celebração da Comemoração da morte de Cristo. Essa ocasião proveu oportunidade para o primeiro batismo cristão no Peru. Três pessoas simbolizaram nessa ocasião sua dedicação a Deus, uma delas sendo Pedro Garay.
MISSIONÁRIOS DÃO AJUDA
O governo recusara a entrada de missionários das Testemunhas. Entretanto, em outubro de 1945, a Sociedade tomou medidas no sentido de que dois diplomados de Gileade, que serviam na Bolívia, entrassem em contato com o Ministério das Relações Exteriores, com o fim de procurarem saber o que impedia nossos missionários de receber seus vistos. Por meio de indagações, soube-se que, se os missionários entrassem no país como turistas e daí pagassem uma taxa equivalente a Cr$ 750,00 por pessoa, poderiam com o tempo obter vistos para permanecer aqui. Portanto, foi depois de muita troca de correspondência e de muitos esforços que finalmente oito missionários de Gileade chegaram ao Peru em 20 de outubro de 1946. Aquele primeiro grupo incluía Walter e Christine Akin, Nellena e Verda Pool os quais permaneceriam dezenas de anos aqui ajudando os semelhantes a ovelhas.
Assim, no fim de 1946 estavam aqui — oito missionários entusiásticos. O que os aguardava? Diante deles estava um território novo. ‘Abria-se-lhes uma porta larga para atividade.’ (1 Cor. 16:9) Tinham que dominar uma nova língua. Mas, o mais importante tinha de ser feito primeiro. Sem conhecerem o espanhol, procuraram e acharam acomodações em hotel, embora escassas. As quatro moças solteiras ficaram num só quarto, cuja porta não tinha nem fechadura, nem trancas. Como não conheciam a vizinhança, tomaram a precaução de amontoar todos os móveis contra a porta antes de irem dormir à noite.
Procurar casa sem conhecimento da língua, nem o valor do dinheiro, foi uma grande tarefa. Na segunda semana no Peru os missionários alugaram uma casa, mas que era muito cara; e um mês depois alugaram então outra. As irmãs carregaram sua própria bagagem e alguns de seus pertences, ao passo que o irmão Akin transportou as coisas mais pesadas num táxi. Mas, pelo menos, estavam estabelecendo-se.
Na primeira reunião com as pessoas interessadas que moravam em Rimac, os missionários se deram conta de que os novos precisavam de muita ajuda. Convidaram, pois, a família Lura e os Garay a assistir às reuniões que se realizariam no novo lar missionário. Na primeira reunião de congregação que se realizou ali, estiveram presentes com os missionários apenas quatro peruanos.
Durante aquelas primeiras semanas em que os missionários davam muito testemunho informal, tornou-se evidente que tinham de aprender rapidamente o idioma falado no Peru. Portanto, decidiu-se que o grupo faria um curso do idioma espanhol, de dois meses, no Instituto Cultural Peru-Estados Unidos. Cada um pagou seus estudos. Tinham então de se preparar para o curso e falar mais o espanhol. Fizeram um esforço em comum para aumentar seu vocabulário. Durante o percurso, tanto na ida como na volta das aulas, pronunciavam com esforço os nomes das ruas e as palavras que apareciam nos vários anúncios, e um missionário corrigia o outro. Mas faziam progresso, e isso os alegrava.
Para muitos missionários treinados em Gileade que foram designados para o Peru, aprender o espanhol tem sido uma “aventura”, e os métodos de ensino têm sido variados. Por exemplo, houve tempo em que os recém-chegados recebiam instrução intensiva por um período de dois meses após sua chegada. No primeiro mês, ficavam a bem dizer “enterrados” nos estudos do espanhol por um período de onze horas por dia. No segundo mês, metade de seu tempo era devotado ao estudo do idioma em casa e a outra metade a utilizar esse conhecimento no serviço de campo. Naturalmente, os missionários mais novos que estavam aprendendo o espanhol podiam sempre tirar proveito ouvindo seus irmãos “mais velhos” falar nesse idioma quando se sentavam juntos em volta da mesa da cozinha num lar missionário tomando uma xícara de café.
Todavia, é incontestável que o melhor treinamento do idioma se recebia no serviço de campo. No “cartão de testemunho” usado há alguns anos na obra de pregação do Reino, havia um excelente testemunho impresso em espanhol, e podia-se pedir ao morador que lesse o cartão. Os novos missionários aprenderam também a fazer breves apresentações que recitavam de cor, como papagaios. Assim, como é que se saíam às portas? Edna Waterfall, uma das missionárias mais recentes a chegar ao Peru, admite:
“Nunca vou esquecer a primeira casa onde eu tive de dar testemunho sozinha. Jeová me deu força para isso. . . . Comecei a suar frio. A empregada me perguntou o que eu desejava, e eu pedi para falar com a dona da casa. . . . Orei silenciosamente a Jeová pedindo sua ajuda, a empregada reapareceu e fui introduzida na sala de estar. Apareceu uma senhora de certa idade, sorriu bondosamente e sentou-se para ouvir o que eu tinha a dizer. Ao apresentar meu sermão decorado, eu tropeçava nas palavras, mostrei-lhe o cartão de testemunho e lhe ofereci o livro ‘Está Próximo o Reino’ em espanhol. Ela ficou com o livro e fiz arranjos para um estudo bíblico, mas aí terminava meu espanhol. Enquanto eu permanecia sentada ali e me perguntava como podia despedir-me de modo elegante, acho que ela compreendeu meu embaraço. Ela sorriu e disse num inglês impecável: ‘Muito bem, tudo isso é excelente. Eu vou estudar com você e falaremos sempre em espanhol para ajudá-la a aprender a língua.’ Fiquei tomada de surpresa e disse: ‘Fala inglês? E escutou-me até o fim no meu péssimo espanhol?’ ‘Foi bom para você’, replicou ela. De fato, foi, e tivemos um maravilhoso estudo.”
UM BOM INÍCIO EM LIMA
Em 5 de dezembro de 1946, ofereceu-se uma oração de agradecimento a Jeová quando os missionários receberam a notificação oficial de que podiam permanecer no Peru como residentes não-imigrantes. Ah, foi maravilhoso! A partir dessa data começou a obra normal de pregação de casa em casa. Os missionários se sentiram felizes de poder usar então todo o seu tempo e toda a sua energia na declaração das “boas novas”.
O primeiro grupo de oito missionários dividiu Lima em oito territórios. O irmão e a irmã Akin receberam o bairro chamado Lince, que revelou ser um campo muito frutífero. Como poderia a irmã Akin jamais esquecer o testemunho que deu à primeira porta ali? Ela apresentou seu cartão de testemunho à dona da casa, leu um versículo ou dois na Bíblia em espanhol e mencionou a contribuição pela publicação. A senhora parecia interessada, disse algo rápido em espanhol e começou a empurrar a irmã Akin rua abaixo. Detiveram-se na frente de uma alfaiataria. A senhora mostrou sua aliança, e a irmã Akin compreendeu que ela queria que falasse com seu marido, o alfaiate. Imagine a surpresa de nossa irmã ao ver não só um alfaiate, mas cinco deles na alfaiataria! Orou a Jeová no seu coração, deu corajosamente o testemunho e ofereceu o livro “A Verdade Vos Tornará Livres”. Os cinco homens procuraram conversar com a irmã Akin, e finalmente o proprietário apontou para a aliança da irmã. Isso queria dizer: Volte com seu marido. Bem, iniciou-se um estudo bíblico domiciliar e resultou em algumas “cartas de recomendação”, futuros companheiros no serviço de Jeová. (2 Cor. 3:1-3) Anos mais tarde, os Akin podiam mostrar as “cartas” resultantes desse primeiro estudo bíblico em Lima. Luis e Adriana Sanchez se tornaram mais tarde pioneiros regulares. Outro dos cinco alfaiates, Flávio Ramos, tornou-se mais tarde pioneiro especial em Lima. Além disso, um rapaz que aceitou o livro oferecido pela irmã Akin naquela alfaiataria tornou-se mais tarde pioneiro especial e serviu nas altas regiões dos Andes.
À medida que nossa obra se difundia na capital ela ia alcançando os Bairros Altos, a parte mais antiga da cidade colonial de Lima. Ali, muitos de nossos livros foram colocados numa das grandes passagens ou “interiores”. Quando as Testemunhas voltaram para continuar seu trabalho, um homem saiu de uma das casas à procura de Nellena Pool. Ele adquirira o livro “A Verdade Vos Tornará Livres” da companheira dela, Lastenia Lura, uma semana antes e o havia lido todo. Este senhor tinha uma longa lista de perguntas, às quais com o tempo obteve as respostas. Não demorou muito e este senhor — Leopoldo Sanchez — começou a assistir às reuniões cristãs e a participar no serviço de campo. Foi batizado em janeiro de 1948, e quatro anos mais tarde ele veio a ser o primeiro dentre os irmãos locais do Peru a ser designado pioneiro especial.
NO INTERIOR
Em meados de 1947, umas 20 pessoas assistiam às reuniões cristãs em Lima. Mas o que dizer de outras partes do país? Pois bem, os missionários aventuraram-se a sair pela primeira vez da capital para ir ao interior do Peru em junho de 1947. A família Garay, que se associava com o povo de Deus desde 1943, tinha uma propriedade em Huancayo. Aquela cidade, no alto dos Andes e a uma distância de 12 horas de trem da capital, achava-se num território típico dos índios. E qual era o idioma principal? O quíchua — a bem antiga língua dos incas.
A irmã Maria Garay pregou diligentemente em Huancayo e encontrou pessoas interessadas ali. Ela usava um cartão de testemunho, e, em vez de uma pasta, ela levava no ombro uma das nossas sacolas de revistas. Não, a irmã Garay não apresentava as revistas nas ruas. Isso não era permitido no Peru. A lei do país não permitia a nenhuma religião, exceto à religião do Estado, a católica romana, sair pelas ruas para fazer qualquer tipo de atividade religiosa. Isso era definido como proselitismo. Também, ao passo que quase em todas as partes do mundo as Testemunhas de Jeová dizem que “colocam” literatura com as pessoas por uma pequena contribuição, no Peru nós somos considerados oficialmente como “vendedores de livros”. Portanto, julgam que “vendemos” Bíblias de casa em casa, o que é permitido por lei.
De qualquer forma, a irmã Garay estava ocupada no serviço de Deus, embora encontrasse dificuldades. Os sacerdotes a seguiam de porta em porta e confiscavam as publicações que ela deixava com as pessoas. Esses clérigos instigavam também os meninos da vizinhança a lhe atirar pedras e a gritar “herege” ou “protestante”. Todavia, havia surgido suficiente interesse em Huancayo para justificar uma visita de Testemunhas que serviam como missionários em Lima.
É deveras uma experiência sem igual ‘escalar a montanha’ para ir até Huancayo. O trem sobe rangendo a uma altitude de quase 4.800 metros antes de começar a longa descida em direção ao vale e à cidade de Huancayo, situada a uma altitude de cerca de 3.340 metros. A falta de suficiente oxigênio afeta muitos viajantes, causando-lhes cruciantes dores de cabeça, tontura ou até mesmo vertigens e vômitos.
Ao chegarem, os missionários reuniram-se alegremente com a irmã Garay. Deram-lhe ajuda e conselho, e estabeleceu-se uma congregação do povo de Deus, e, no fim do ano de serviço de 1948, cinco publicadores do Reino relatavam serviço de campo em Huancayo.
DISSEMINAÇÃO DA VERDADE COM AS REVISTAS
Em fins da década de 1940, o incrementado uso de A Sentinela e Despertai! estava abrindo o caminho para que muitos novos chegassem a se associar com o povo de Jeová no Peru. Naquela época, por volta de 1948, enviavam-se gratuitamente sete exemplares de cada número a cada proclamador do Reino por tempo integral. A distribuição aumentava, mas nem todos os irmãos colocavam suas revistas. Portanto, estas começaram a acumular. Alguns dos missionários tiveram, pois, uma idéia — ‘Por que não organizar um dia especial e sair para colocar essas revistas?’ Logo diversos missionários da área de Rimac, em Lima, participavam todos os sábados no serviço de pregação com as revistas. Notando seu êxito nessa atividade, outros se juntaram a eles. Foi assim que as Testemunhas locais logo se puseram ativamente a apresentar só revistas às pessoas nas suas portas cada sábado. E, em pouco tempo, aumentaram seu pedido de revistas para essa atividade produtiva.
Mais tarde, quando o irmão Knorr chegou ao Peru, ele estava muito interessado em saber por que era muito maior o número de revistas colocadas em Lima do que em diversas outras partes. Qual era o motivo? Ora, os irmãos as usavam todos os sábados no trabalho em grupo com as revistas! Será que foi então que surgiu a idéia de se ter regularmente um “Dia de Revistas”? Nós no Peru não temos certeza, mas parece bem possível. De qualquer forma, foram desenvolvidos muitos itinerários com as revistas e diversos estudos bíblicos foram iniciados em resultado de colocações de revistas.
ESTABELECIMENTO DA FILIAL
Houve grande emoção no começo de 1949 quando se soube que N. H. Knorr e seu secretário, M. G. Henschel, visitariam o Peru. Por isso, em 5 de março, uns 50 irmãos e pessoas interessadas foram dar boas-vindas aos viajantes quando chegaram ao aeroporto de Lima. Coincidia com a visita uma assembléia que seria realizada no Salão do Reino do lar missionário situado em Ramón Dagnino, 256. Foi grande a alegria de ver 224 pessoas presentes para o discurso público do irmão Knorr intitulado “Já É mais Tarde do que Pensais!” Durante essa visita, um grande grupo de Testemunhas se dirigiu para uma das praias e 20 pessoas foram batizadas.
Mas uma surpresa aguardava os cristãos peruanos. Um pouco mais tarde, o irmão Knorr deixou os missionários exultantes ao lhes explicar uma das razões principais de sua visita. Qual era? A Sociedade Torre de Vigia estabeleceria uma filial no Peru. Um dos missionários foi designado como o primeiro superintendente da filial.
Mal tinha começado em outubro de 1950 a nova filial quando sofreu transtornos. O primeiro superintendente de filial foi substituído e suas responsabilidades foram assumidas por Robert Hoyt, um diplomado da décima quinta classe de Gileade. Nossa obra em Lima estava expandindo rapidamente, de modo que no fim do ano foi estabelecido um novo lar missionário no bairro de San Isidro, na capital. Também, o lar missionário da filial foi mudado para um novo local, em Pasaje Velarde, mais perto do centro de Lima. O irmão Hoyt se pôs imediatamente a organizar a filial e a prepará-la para o grande trabalho à frente.
NAS PROVÍNCIAS
Estando então organizada a nova filial, nossas atividades expandiam. Por exemplo, preparavam-se discursos públicos que foram dados em diversos lugares. Mesmo então, era além de imaginação a grande quantidade de trabalho que tinha de ser feito neste país que tinha nessa época uma população de uns 7.000.000 de habitantes. Quão sinceramente oravam os irmãos para que o “Senhor da colheita” enviasse mais trabalhadores! (Mat. 9:37, 38) Logo chegaria a resposta. Vinte e um missionários da décima terceira turma de Gileade estavam para chegar ao Peru. Chegaram nos meses de dezembro de 1949 e em janeiro de 1950. Seis foram enviados para Trujillo no norte do país. Sete dentre eles rumaram para a grande cidade de Arequipa, no sul. E formou-se um lar missionário para oito trabalhadores em Callao, o maior porto marítimo do Peru, situado a 13 quilômetros a oeste de Lima.
Sendo uma cidade portuária, Callao tinha elevado índice de crimes e imoralidade. Não obstante, as atividades de pregação do Reino revelaram ser frutíferas ali. Com efeito, foram encontradas algumas pessoas com quem Victor Lura entrara em contato anos antes ao distribuir tratados naquela cidade portuária. Não demorou muito e alguns residentes de Callao começaram a assistir às reuniões cristãs. Entre eles se achavam Arturo Guzman e sua esposa, bem como Manuel Calderon, Victor Cespedes e a família de Carlos Vega. Atualmente, seis congregações ativas, com um total de 367 proclamadores do Reino, estão declarando as “boas novas” em Callao.
Arequipa revelou ser ‘um osso duro de roer’. Por muitos anos esta cidade tem sido conhecida como o “Pequeno Vaticano”, pois seus habitantes estão arraigados nas tradições e costumes católicos. O novo lar missionário ali se tornou o centro das reuniões e atividades da congregação. O progresso foi lento, embora se encontrassem pessoas interessadas depois de diligente busca de casa em casa. Certa vez, porém, as coisas foram invertidas — uma pessoa interessada procurou diligentemente a verdade. Certo jovem de nome Eliseo Balboa observou um “gringo”, sentado sozinho num parque, que lia um livro. Por que é que chegara ao Peru? O Sr. Balboa estava curioso de saber. O irmão Horace Criss explicou-lhe que ele era cristão, que era ministro. O Sr. Balboa estranhou isso, porque todos os ministros que ele conhecia usavam roupa longa e preta. Foi assim que começou um testemunho que resultou num estudo bíblico.
Depois de apenas alguns estudos, o Sr. Balboa deixou Arequipa à procura de serviço secular. Com o tempo ele foi a Callao, onde indagou sobre as Testemunhas de Jeová e o local de suas reuniões. Finalmente, encontrou a irmã Charlotte Barron, que estava distribuindo revistas de banca em banca na feira. Obteve o endereço da filial e o Sr. Balboa assistiu a algumas reuniões cristãs. Daí, sua procura de serviço secular fez com que partisse novamente, dessa vez para um campo de mineração do vanádio, em Jumasha, nas altas regiões dos Andes. Entretanto, manteve contato com a filial por meio de correspondência. Também, apesar de uma viagem longa e penosa, Robert Hoyt visitou o Sr. Balboa. Isto fortaleceu espiritualmente esse jovem e também forneceu oportunidade de ajudá-lo na obra de pregação, que ele fez sozinho depois disso. Mais tarde, voltando a Arequipa, o irmão Balboa foi ajudado espiritualmente pelos missionários a ponto de entrar na obra de pregação de tempo integral.
Em Trujillo, no norte, o missionário Harvey Conrow encontrou uma pessoa semelhante a ovelha, Encarnacion Leiva. Ela a bem dizer absorveu a verdade bíblica mas que lhe era transmitida só oralmente, pois não sabia ler nem escrever. Todavia, sendo nessa época uma mulher decidida, de 51 anos de idade, ela obteve um livro que podia ajudá-la a aprender as letras e a ajuntá-las em palavras. Com a ajuda de suas filhas, logo aprendeu a ler e a escrever, tornando-se uma capacitada proclamadora do Reino em Trujillo. Ela confessou mais tarde que, sem a verdade como incentivo nunca teria tentado alfabetizar-se. A irmã Leiva faleceu em 1967, como idônea e fiel testemunha de Jeová.
A Assembléia do Aumento da Teocracia, de 30 de julho a 6 de agosto de 1950, no famoso Estádio Ianque, na cidade de Nova Iorque, suscitou viva animação no Peru. Doze missionários fizeram a viagem, acompanhados de três publicadores locais. As humildes e amorosas Testemunhas peruanas que não viajaram pensavam que nunca mais veriam os missionários. Mas não foi assim! Todos eles voltaram para suas designações.
ARRUACEIROS EM CHOSICA
Em 1950, Emil e Clara Müller mudaram-se da Suíça para Chosica, uma cidade do interior, a leste de Lima, a uma hora de carro da capital. Mais tarde, o pioneiro Leopoldo Sanchez os encontrou quando estava dando testemunho nessa cidade, onde o irmão Müller trabalhava na usina hidrelétrica. Mais tarde ainda, em julho de 1955, Betty Myers, uma pioneira especial, começou a servir em Chosica.
Certo dia, a irmã Myers bateu à porta de uma senhora que era católica fanática e amiga íntima do sacerdote daquele lugar. Essa senhora ficou furiosa de que uma Testemunha de Jeová batesse à sua porta. A irmã Myers e sua jovem companheira de serviço de pioneiro mal se haviam afastado e desciam a rua quando a enfurecida senhora se aproximou delas junto com um bando de meninos arruaceiros.
O que é que essas duas Testemunhas pensavam fazer nessa vizinhança católica? Os amotinados queriam saber. Ora, estavam fazendo uma boa obra cristã e tinham todo o direito de fazer isso, replicou a irmã Myers! O sacerdote entrou logo em cena. Ele exigiu que as duas Testemunhas partissem imediatamente. Mas a jovem irmã pioneira, que outrora fora namorada do próprio padre, pediu-lhe que lhe mostrasse onde a Bíblia dizia que ela não devia pregar as “boas novas”. Foi a vez dele de ficar furioso. Afinal, ela tinha embaraçado seu ex-namorado diante daqueles jovens arruaceiros.
A situação era quase cômica, mas o que se seguiu não o foi. Quando as duas irmãs se afastaram e começaram a ir mais abaixo na rua, os meninos começaram a atirar-lhes bolas de barro contendo pedrinhas dentro delas. Atiraram até que as duas cristãs ficaram completamente cobertas de barro. Uma pedra fez um corte na orelha da irmã pioneira, que sangrou profusamente. Por fim, um idoso senhor de cor — ele próprio católico fervoroso — chamou-as para dentro do jardim de seu pátio e espantou os meninos, repreendendo-os.
A irmã Myers foi diretamente à delegacia de polícia e deu parte do incidente, pedindo proteção. Em resultado disso, um policial à paisana foi designado para acompanhar as irmãs na sua atividade. Não muito depois disso, diversos meninos tentaram repetir a hostilidade de atirar pedras. Mas o policial à paisana os apanhou, obteve o nome deles e ‘deu ordens terminantes’ a seus familiares. Isso pôs fim aos motins em Chosica.
NOVO ARRANJO PARA MISSIONÁRIOS
Os missionários treinados em Gileade continuaram a chegar ao Peru em grande número durante o começo da década de 1950. Por exemplo, no fim de 1952, 46 missionários haviam chegado a este país. Desse número, 20 deixaram o serviço, alguns por ficarem dessatisfeitos com a vida de missionário. Mas 26 permaneceram ativos no campo peruano.
No ano de 1952, houve um arranjo diferente para os missionários que chegavam ao Peru. Não mais podiam entrar no país como instrutores, como entravam antes. Tinham de entrar no país como turistas. Após sua entrada no Peru, tinham de matricular-se na Universidade de San Marcos, que é a mais antiga do hemisfério ocidental. Estudavam o idioma e, nessa base, podiam requerer permanência como estudantes. Só quando recebiam suas carteiras permanentes, ou papéis oficiais, é que podiam empreender suas atividades missionárias como os outros diplomados de Gileade. Este arranjo foi bastante eficaz e durou cerca de quatro anos.
‘E, DAÍ, PARA A CHINA’?
Em princípios de 1953, nossa atenção se concentrou na Assembléia da Sociedade do Novo Mundo que seria realizada na cidade de Nova Iorque, de 19 a 26 de julho. Vôos fretados levaram 20 missionários e um casal de Testemunhas peruanas, junto com 18 irmãos da Bolívia à cidade da assembléia. Logo após aquele congresso espiritualmente proveitoso, mais missionários chegaram ao Peru. Mas foi bem perto do fim de 1953 que os proclamadores do Reino neste país usufruíram um evento especialmente edificante.
Em dezembro de 1953, os irmãos N. H. Knorr e M. G. Henschel visitaram o Peru. Após vários dias de procura, encontrou-se um local muito apropriado para reunião nessa ocasião, o Salón Majestic em Pueblo Libre, um bairro residencial de Lima.
Foi especialmente memorável um comentário feito pelo irmão Knorr durante seu discurso final na assembléia. Por que estavam os missionários no Peru? O irmão Knorr indicou que estavam ali para ajudar os irmãos peruanos a atingir a necessária madureza, a fim de poderem assumir diversas responsabilidades na congregação do povo de Deus e desincumbir-se delas. Uma vez cumprido isso, disse ele, os missionários estariam livres para a obra em outros campos. “E, daí”, observou ele, olhando ao redor, “enviaremos os missionários para a China!” Naturalmente, isso não aconteceu. Contudo, o irmão Knorr expressou em termos claros quais eram os privilégios e as responsabilidades dos missionários no Peru.
Havia certamente muito trabalho a fazer entre o próprio povo peruano. Assim, um outro aspecto da nossa atividade, que foi iniciado em 1953 e continuado com mais vigor em 1954, foi o de cuidar de territórios não-designados. As congregações de Lima e Callao se espalharam em todo os distritos circunvizinhos, com o fim de ali declararem as “boas novas”. As Testemunhas de Callao foram a lugares tão afastados como Cañete e Chincha Alta, ao passo que as de Lima foram a Puente Piedra, Ancón e Huaral.
UM TEMPO DE FORTALECIMENTO ESPIRITUAL
Além dos 26 missionários que serviam no Peru em 1952, havia 260 publicadores do Reino associados com sete congregações que funcionavam então. Havia duas congregações em Lima, bem como uma em cada cidade de Callao, Arequipa, Trujillo, Chosica e Huancayo. Três anos mais tarde, em 1955, o Peru tinha em média 460 publicadores, com um auge de 563.
Para fazer face ao contínuo aumento durante esse período geral tornou-se necessário dar atenção ao fortalecimento espiritual dos cristãos peruanos. Era preciso, por exemplo, dar consideração à educação dos filhos, não permitindo que fossem contaminados com os falsos ensinos religiosos. A lei exige que se ensine em todas as escolas a religião nacional, a católica. Todavia, os não-católicos podem requerer ser eximidos dessa instrução religiosa. Por conseguinte, foi necessário preparar cartas no sentido de que tal pessoa era Testemunha de Jeová e estava recebendo adequada instrução religiosa de outras fontes. Essas cartas eram enviadas às autoridades escolares e os requerimentos eram considerados pelo Ministério da Educação antes de se conceder isenção. Especialmente desde essa época têm as Testemunhas peruanas empregado este método para evitar que seus filhos em idade escolar sejam expostos aos falsos ensinos e práticas de Babilônia, a Grande.
Tornou-se também necessário dar muita ênfase à necessidade da pureza moral. Alguns homens no Peru viviam com uma, duas ou três mulheres ao mesmo tempo, tendo talvez filhos de cada uma delas. Ou então, um homem e uma mulher viviam juntos num lar respeitável, tendo diversos filhos, sem se casarem legalmente. Portanto, sérias decisões tinham de ser feitas para fazer o casamento ser honrado biblicamente como o deve. (Heb. 13:4) Embora as circunstâncias individuais fossem diferentes, parece suficiente dizer que diversos dos cristãos peruanos hoje têm a profunda satisfação de saber que resolveram seus problemas morais de modo piedoso.
A OBRA DO CIRCUITO, UM DESAFIO
Em 1953, o país inteiro do Peru formava um só circuito. Quando Sidney Fraser se tornou o superintendente de filial naquele ano, Robert Hoyt começou a servir no campo como superintendente de circuito. Era um verdadeiro desafio viajar pelo país inteiro visitando as sete congregações e os diversos grupos isolados que manifestavam interesse na verdade bíblica.
Durante uma viagem inesquecível, o irmão Hoyt teve de viajar quase 20 horas na traseira de um caminhão, sentado sobre um carregamento de peixe seco que estava sendo transportado para a serra. Os quartos de hotel na serra deixavam sempre a desejar. Ali havia preferência por quartos comunais. Havia diversas camas num quarto, para qualquer pessoa que chegasse, quer homem, quer mulher, e precisasse de lugar para passar a noite. Fazendo bom uso de uma cadeia e cadeado que costumava levar consigo, o irmão Hoyt prendeu com a cadeia sua mala na cabeceira de uma cama e saiu à procura de um banheiro ou seu equivalente. Ao regressar, encontrou uma mulher na sua cama! Ela havia decidido que ia dormir ali. Visto que não havia outra cama disponível, isto representou um problema. Mas havia evidência de que ele chegara primeiro, devido à cadeia presa à cabeceira da cama! Felizmente, o gerente do hotel conseguiu dar uma solução, de modo que nosso superintendente de circuito pôde ficar com a cama e usufruiu uma muito necessitada noite de repouso.
Naturalmente, à medida que Jeová fazia prosperar nossas atividades cristãs, aumentou o número dos circuitos e programou-se maior número de assembléias de circuito. Numa dessas, realizada em Surquillo, um bairro de Lima, havia entre as pessoas na assistência um dentista, cuja esposa se lhe opunha amargamente. Quando ele chegou, todos podiam notar que estava de chinelo de quarto. O que havia acontecido? “Bem”, disse ele, “minha esposa escondeu meus sapatos para impedir que eu viesse. Mas aqui estou!” Sim, quer os obstáculos sejam grandes, quer pequenos, quão importante é permanecermos firmes na verdade!
FILMES AJUDAM A MUITOS
Uma nova fase da nossa obra teve início no Peru em 1954 — o uso de películas cinematográficas para ajudar as pessoas espiritualmente. O primeiro desses filmes produzidos pela Sociedade Torre de Vigia se intitulava “A Sociedade do Novo Mundo em Ação”. Que impressão causou nos assistentes! Centenas de pessoas afluíram para ver esse filme que fornecia uma clara visão das atividades das Testemunhas de Jeová.
O filme foi exibido num salão dos trabalhadores de Casapalca, uma cidade de extração de minérios nos Andes, situada a uma altitude de 4.600 metros. O salão ficava do lado de uma usina hidrelétrica, e, por conseguinte, a voltagem era muito alta. Embora se reduzisse ao máximo a velocidade do projetor, o filme corria mais rápido do que o leitor do texto podia acompanhar. Além disso, a atmosfera rarefeita naquela altitude tornava difícil a respiração. Como é de imaginar, houve evidentemente algumas falhas num ponto ou noutro. Contudo, todos os presentes apreciaram a exibição do filme.
Numa assembléia de circuito, durante a exibição do filme em Callao, em setembro de 1954, tudo correu bem no primeiro carretel. Mas, durante o segundo carretel do filme, o carretel para enrolá-lo parou de funcionar. Oh, o filme estava passando bem pela máquina! Quando finalmente nos demos conta do defeito, havia um montão de filme espalhado no chão. Sim, levou alguns minutos para os irmãos o enrolarem à mão. Durante o resto da exibição, o carretel de enrolar o filme precisou ser virado à mão, mas foi possível passar o filme.
Anos mais tarde, o filme da Sociedade, intitulado “Proclamando ‘as Boas Novas Eternas’ ao Redor do Mundo”, foi exibido em todo o Peru, e foi certamente um forte golpe para Babilônia, a Grande, o império mundial da religião falsa. Em Toquepala, foi exibido perante uma assistência de 3.251 pessoas. Como era de esperar, um sacerdote fez tudo o que pôde para impedir a exibição do filme. Não tendo êxito os seus planos, entrou furtivamente no salão escuro depois de ter começado a exibição do filme, obviamente tendo curiosidade de vê-lo. Ora, o filme terminou, as luzes se acenderam, e lá estava ele à plena vista. Ficando muito embaraçado, o sacerdote se levantou e saiu do salão como que dançando, feito criança, e cantando alto: “Caiu Babilônia, a Grande. Caiu Babilônia, a Grande.” Estavam presentes muitos católicos que assistiram a este espetáculo ‘babilônico’ feito pelo seu sacerdote.
FACILITADA A ENTRADA DE MISSIONÁRIOS
No ano de 1955, todos os missionários que chegavam ao Peru ainda entravam como turistas e se matriculavam na Universidade de San Marcos enquanto procuravam obter permanência no país. Entretanto, enquanto pregava de porta em porta em Lince pouco depois de sua chegada ao país, a missionária Lucille Rapraeger visitou o lar de um funcionário do Ministério das Relações Exteriores. Ele reconheceu que ela estava fazendo serviço missionário e, naturalmente, obteve seu nome.
Alguns dias mais tarde, Nellena e Verda Pool, bem como a irmã Rapraeger, foram falar com um advogado com que Nellena havia colocado publicações. Chamando-a à parte, ele disse: “Nellena, uma de suas missionárias está em dificuldade.” O que queria dizer? Ora, esse advogado, quando esteve no gabinete do Ministério das Relações Exteriores, notou que o pedido de permanência da irmã Rapraeger estava sobre uma escrivaninha pronto para ser indeferido. Evidentemente, isto foi em resultado de sua visita ao lar do funcionário do Ministério das Relações Exteriores. A filial da Sociedade foi imediatamente informada do assunto.
O advogado, que já demonstrara interesse pelas Testemunhas de Jeová, usou sua influência para solucionar este problema. A missionária permaneceu no Peru. Por meio dos préstimos desse jurista, outros missionários foram ajudados a entrar no país — dessa vez como missionários e não mais como estudantes de universidade. Dessa época em diante, a Sociedade conseguiu obter vistos para missionários designados a este país.
CORAJOSOS CRISTÃOS NEUTROS
Quer jovens, quer idosos, os cristãos peruanos enfrentaram provações envolvendo Deus e o Estado. Por exemplo, segundo a lei, todos os rapazes que atingem 19 anos de idade precisam alistar-se para prestar dois anos de serviço militar. Isto causou problemas em 1956 para certos pioneiros especiais enviados a Cusco, Arequipa e a outros lugares no interior para ali pregarem, pois muitos deles eram jovens de 19 ou 20 anos de idade.
De fato, muitos irmãos no Peru procuraram ser eximidos por escusa de consciência e/ou como ministros, mas as autoridades reconheciam só os clérigos católicos como ministros religiosos. Por isso, não foram poucos os casos em que jovens Testemunhas que tentaram obter reconhecimento como ministros foram espancados, lançados em celas infetadas e sofreram toda sorte de maus tratos por causa de sua posição como cristãos neutros. (Miq. 4:2, 3; Tia. 1:27) Neste país nunca houve provisão de isenção do serviço militar para pessoas que têm objeção a ‘aprender a arte da guerra’.
A neutralidade cristã preocupa também os pais piedosos como seus filhos. No Peru, as crianças em idade escolar precisam fazer um curso de treinamento pré-militar. Não está previsto nenhum caso de isenção, e, no fim do período, quem não faz o curso não passa de ano. Tal aluno não pode progredir nos estudos e receber seu diploma. Embora se possam fazer outros arranjos para ajudar as crianças a receber instrução de outra maneira, alguns pais transigiram e permitiram que seus filhos ‘aprendessem a arte da guerra’
Todavia, para vencer esse problema, uma congregação em Chimbote perguntou se podia organizar uma classe no Salão do Reino usando voluntários dentre os irmãos para ensinar diversas matérias às crianças. Isto surtiu efeito, especialmente visto que algumas atividades cristãs também são incentivadas e efetuadas após os estudos regulares da escola.
Contudo, isso não significa que os pais e seus filhos encontram apenas problemas pequenos no que diz respeito a manter sua neutralidade cristã, evitar a idolatria e atribuir a salvação a Jeová. (Êxo. 20:4-6; Sal. 3:8) Em 1970, por exemplo, na cidade de mineração de Toquepala, 10 jovens Testemunhas foram expulsas da escola por não saudarem a bandeira e não cantarem o hino nacional. Em outros casos isolados, crianças cristãs foram intimadas a comparecer perante as autoridades para explicar por que não tomam parte em tais cerimônias. — Mar. 13:9; 1 Ped. 3:15.
Através dos anos, por causa de nossa posição como cristãos neutros, temos enfrentado problemas. Por exemplo, em 1975 tivemos de mudar o local de uma assembléia na cidade universitária de Trujillo para outra cidade, devido à onda de patriotismo que surgira porque uma jovem Testemunha em idade escolar não participou em cantar o hino nacional, nem em saudar a bandeira. As autoridades locais recusaram-se a reconhecer nossa posição de neutralidade, e os jornais no norte do Peru traziam manchetes tais como: “Testemunhas de Jeová recusam honrar os emblemas nacionais.” Alguns artigos nos acusaram falsamente de submeter as pessoas a uma “lavagem cerebral” por meio de um “curso de seis meses”, durante o qual supostamente ensinávamos doutrinas contrárias aos interesses do país.
Em Lima, a capital, um sacerdote católico pregou esse mesmo tipo de mensagem pelo rádio duas vezes ao dia durante uma semana. Mas, o que ele disse resultou num bom testemunho a favor da verdade. Ele declarou explícita e concisamente o que nós cremos, mas, atrapalhou-se quando tentou refutar nosso conceito bíblico sobre o ano de 1914 e a doutrina da Trindade.
No mesmo tempo em que houve publicidade adversa, o governo decretou que em janeiro de 1976 todos os rapazes e as moças de 18 anos de idade tinham de alistar-se para serviço militar compulsório. Naturalmente, o povo de Jeová cumpriu com a lei por se registrar. Visto que tantos jovens dentre as Testemunhas eram pioneiros, forneceu-se-lhes um certificado que atestava que a sua vocação de livre vontade era a de serem pregadores da Palavra de Deus. Segundo se sabe, todos esses pioneiros optaram por preparar uma documentação sobre sua vida dedicada ao serviço de Jeová e apresentar essa matéria junto com um requerimento de isenção do serviço militar na qualidade de pregadores. Nos anos anteriores, o Manual do Código Militar previa a possibilidade de isenção para membros do clero ou leigos sem nenhuma especificação quanto à religião. Entretanto, acrescentaram depois algo novo, e todo requerimento de isenção tinha de ser assinado e aprovado pelo arcebispado da Igreja Católica, a religião reconhecida pelo Estado. Contudo, nossos irmãos apresentaram sua documentação e o requerimento ao se registrarem. Embora alguns desses documentos não fossem aceitos por não trazerem o selo de aprovação do prelado, outros foram aceitos. E, quando saíram as primeiras listas em janeiro de 1976, notou-se que pelo menos alguns irmãos haviam recebido isenção à base de suas atividades religiosas.
COISAS VISTAS PELA PRIMEIRA VEZ NAS ASSEMBLÉIAS
Agora que terminamos nossa história dos cristãos neutros neste país, voltemos aos fins da década de 1950.
O ano de 1957 começou com uma visita bem programada de Milton G. Henschel, da sede da Sociedade em Brooklyn. As Testemunhas de todas as partes do Peru se reuniram numa assembléia que fora programada para coincidir com esta visita proveitosa. A assistência no primeiro dia foi de apenas 389 pessoas. Mas, para o principal discurso de domingo, a assistência foi de 1.044 pessoas. Que alegria foi ver pela primeira vez mais de 1.000 pessoas presentes a uma assembléia neste país!
Em 1958, usufruiu-se outra coisa vista pela primeira vez em relação a uma assembléia. Naquele ano, foi realizada pela primeira vez uma assembléia de distrito em Iquitos — nas margens do Amazonas, no coração da selva. Naquela região equatorial, a chuva é imprevisível e abundante. Foi um tanto paradoxal ouvir um irmão discursar sobre o Cântico de Salomão e dizer: ‘Vem, minha querida, pois eis que passou a estação chuvosa e acabou o aguaceiro’, ao passo que o telhado de zinco da assembléia amplificava o barulho da chuva torrencial bem naquele momento. — Cân. 2:10, 11.
Foi preciso escolher com cuidado o lugar para o batismo durante aquela assembléia. Embora não se encontrem com freqüência as piranhas carnívoras no rio Amazonas, não se podia ter certeza quanto aos braços e afluentes. Felizmente, porém, o batismo foi realizado sem fatalidades.
ASSEMBLÉIAS APESAR DE DIFICULDADES
A Assembléia Internacional da Vontade Divina das Testemunhas de Jeová, realizada na cidade de Nova Iorque durante o verão de 1958, suscitou viva animação em todo o Peru. Muitas Testemunhas haviam economizado para a viagem, e, quando chegou a hora de viajar, 82 congressistas estavam prontos para embarcar. No momento da partida, foi muito comovente ver cerca de 350 irmãos no terraço do aeroporto e ouvi-los entoar cânticos do Reino.
Perto do fim de 1958, foram feitos preparativos para a realização de uma assembléia de distrito no mês de janeiro seguinte, no estádio do clube atlético de Lima. Mas o então Ministro do Interior, um católico fervoroso, decidiu interromper a assembléia, embora não agisse senão no próprio dia em que ela devia começar. Todo o equipamento havia sido transportado para o estádio, as equipes do restaurante estavam preparando o almoço, e estavam em andamento os preparativos para as reuniões da tarde, quando um caminhão cheio de policiais parou bruscamente em frente do estádio, os quais começaram a nos retirar de lá. Foram inúteis os esforços de tentar entrar em contato com o Ministro do Interior.
A assembléia teve de ser transferida para os dois maiores Salões do Reino em Lima, e foi necessário os oradores proferirem discursos em ambos os lugares. Não obstante, tivemos uma boa assembléia e as dificuldades só serviram para fortalecer os irmãos para provações futuras.
Gostaríamos de mencionar o discurso da assembléia de 1958 que tinha por tema “Servindo Onde a Necessidade É Grande no Além-mar”. Indicava a necessidade de mais proclamadores do Reino em muitos países. Com o tempo, diversas pessoas interessadas em expandir seu serviço se mudaram para o Peru, quer sozinhos, quer com a família. Na realidade, porém, entre os que chegaram primeiro ao Peru estava Eileen Sobie, que chegou do Canadá em setembro de 1957. Mas continuaram a chegar irmãos e irmãs. Muitos tiveram de partir mais tarde, por diversos motivos, mas pode-se dizer que todos contribuíram para a edificação da fé dos irmãos e irmãs no Peru.
REGISTRO LEGAL
Em 1958, por ocasião da assembléia de Nova Iorque, pediu-se ao superintendente da filial que registrasse legalmente, ao retornar ao Peru, a Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados de Pensilvânia. Entre outras coisas, tal registro era necessário para a Sociedade poder ter propriedades.
Assim, a Sociedade foi devidamente registrada em 29 de abril de 1959. Desde então, todas as propriedades compradas pelas congregações ou doadas pelos irmãos para a construção de Salões do Reino têm sido registrados no nome da Sociedade.
NOITE DA “CATÁSTROFE”
Naturalmente, nem todos os desenvolvimentos são em grandes proporções. Às vezes, porém, incidentes relativamente pequenos criam grandes problemas. Portanto, vamos contar-lhe o que chamamos humoristicamente a noite da “catástrofe”.
As missionárias Edna Waterfall e Lucille Rapraeger foram enviadas a Puno, que fica nas margens do lago Titicaca, a uma altitude de uns 3.800 metros. Essas irmãs tinham aquecedores a querosene que não funcionavam muito bem nessa altitude. Após uma excelente reunião no Salão do Reino, certa noitinha de domingo, a irmã Rapraeger subiu para seu quarto. Mas, quando ela acendeu a luz, era impossível enxergar o que quer que fosse. O aquecedor havia soltado fumaça por duas horas. Naturalmente, ela o apagou e abriu a janela antes de descer.
Edna Waterfall deu uma olhada na irmã Rapraeger e deu um grito. Ora, ela estava com o rosto todo preto de fuligem! Todos subiram para ver a “neve” preta. Bem, foi preciso fazer uma grande limpeza naquela noite e no dia seguinte. Que tarefa não foi tirar aquela fuligem pegajosa das paredes, das roupas, dos cobertores e dos livros! Mas recobraram ânimo quando 60 pessoas compareceram naquela semana à primeira assembléia em Puno.
CLÉRIGOS INSTIGAM OPOSIÇÃO
Naturalmente, enfrentamos também sérios problemas e nossa fé foi posta à prova. Encontramos às vezes oposição direta, até mesmo ataque violento por parte de amotinados. Por exemplo, considere o que aconteceu às missionárias Frances e Elizabeth Good na longínqua cidade de Moyobamba, situada na selva. O único meio de se chegar ali era de avião e, por ser isolada, era uma cidade muitíssimo religiosa. Como os sacerdotes espanhóis dominavam o povo com mão de ferro, haviam inculcado a idéia de que ‘sobreviria desgraça a quem ousasse falar contra as imagens da Igreja’.
Tão logo chegaram em Moyobamba, nossas irmãs missionárias começaram a dar testemunho de casa em casa e a convidar as pessoas às reuniões cristãs recém-estabelecidas na cidade. Haviam convidado apenas algumas pessoas de coração honesto quando começaram a aparecer folhetos nas ruas. O que diziam estes? “Há dois elementos perigosos em Moyobamba — duas mulheres que não acreditam no Inferno, nem nas nossas imagens. Não as escutem, não aceitem suas publicações. Tragam quaisquer que porventura tenham e nós nos encarregaremos delas.”
Quase que imediatamente as duas missionárias se tornaram o alvo de uma campanha de ódio instigada pelo clero. Durante uma reunião cristã, uma turba composta de cerca de 50 homens e meninos, encabeçada por três sacerdotes, lançou-se contra o Salão do Reino feito de tijolo cru, de um só aposento. As irmãs tinham fechado a porta com ferrolho e ela resistiu aos golpes dos opositores. Mas, entre outras coisas, os amotinados atiraram excremento de vaca em todo o lado externo das paredes. Também, as duas missionárias foram ameaçadas de violência física se não deixassem a cidade.
No dia seguinte, nossas irmãs foram falar com o prefeito da cidade e explicaram o que acontecera. Ele ficou pasmado; redigiu-se então uma carta de protesto ao Prefeito do Departamento. Prometeu-se proteção às irmãs, mas continuaram as ameaças e hostilidades em geral.
Os sacerdotes prometeram dar um livro de histórias em quadrinhos a cada menino que levasse uma de nossas publicações à escola paroquial. Tempos depois, o prefeito enviou um policial de Lima para se postar à porta do Salão do Reino durante nossas reuniões cristãs. Os opositores perderam a batalha, pois um auge de 26 pessoas estiveram presentes às reuniões durante as visitas do superintendente de circuito, e duas pessoas semelhantes a ovelhas foram batizadas, não obstante a oposição instigada pelo clero em Moyobamba.
Consideremos agora outro exemplo da frustrada oposição clerical. Em novembro de 1959, Reginald e Irene Wallwork iniciaram a obra de pregação do Reino em Ayacucho. Mais tarde, Merle Laurens e Phyllis Wepener se uniram a eles. Quando se soube que esses cristãos eram Testemunhas de Jeová, não levou muito tempo para os sacerdotes se oporem. Fizeram isso de modo sutil. Foram ter com as autoridades políticas e as pressionaram a fazer algo para expulsar os missionários da cidade. Por conseguinte, certo dia o irmão Wallwork foi intimado a comparecer no gabinete do Departamento de Investigações. Ali, ele foi crivado de perguntas, mas também lhe mostraram o requerimento assinado por nove sacerdotes e pelo prefeito. Esse documento havia sido enviado a Lima, de modo que se ordenara uma investigação. Isso poderia ser grave.
O irmão Wallwork refutou prontamente todas as mentiras que os sacerdotes haviam dito. Ele explicou também que havia falado recentemente com o prefeito e o achava um homem razoável, bastante interessado na Bíblia. O que é que então havia acontecido? Ora, alguém no gabinete do prefeito estava trabalhando em combinação com os sacerdotes. Essa pessoa havia enfiado o requerimento no meio de outros papéis, de modo que o prefeito havia assinado o documento sem realmente saber seu conteúdo. Tudo isso foi relatado à filial da Sociedade e, visto que nossa obra era bem conhecida em Lima, o plano inteiro “caiu por terra” sem maiores dificuldades.
Naturalmente, os sacerdotes não ficaram contentes com isso. Toda vez que passavam em frente do lar missionário, carregando ídolos religiosos durante as procissões, nunca deixavam de parar, olhar para o terraço do lar e pronunciar algum esconjuro contra todos os que residiam ali.
TEMPO DE EXPANSÃO
A obra de declarar as “boas novas” estava tendo excelente progresso quando N. H. Knorr visitou o Peru em dezembro de 1959. Havia planos para a realização de uma assembléia em conexão com essa visita. Mal fazia um ano, porém, que havíamos sido expulsos do local que havíamos escolhido para nossa assembléia. Portanto, a fim de impedir a mesma situação, impetramos um habeas-corpus contra o Ministro do Interior. Quando confrontado com isso, ele negou toda responsabilidade no tocante a que nos ocorrera no ano precedente e até mesmo se declarou amigo das Testemunhas de Jeová. De modo que realizamos uma excelente assembléia no Estádio “U”, onde bem mais de 2.000 pessoas assistiram ao discurso principal. Isso foi quase o dobro do número de publicadores do Reino no país. Falando-se de passagem, não demos prosseguimento ao habeas-corpus, embora ainda se encontre nos arquivos do Palácio da Justiça em Lima.
Na ocasião da visita do irmão Knorr, Bent Pedersen foi designado superintendente de filial. A expansão era o grande item da agenda de nosso visitante. Considerou-se a construção de uma nova filial com lar missionário em Lima.
No mês de junho seguinte, começou a construção em Miraflores. A Sociedade tinha comprado dois terrenos que abrangiam uma superfície de 738 metros quadrados. Construiu-se ali um belo prédio de dois pavimentos para abrigar a filial e o lar missionário. No andar térreo se achavam o escritório, as salas de estoque, um grande vestíbulo e um Salão do Reino com 200 assentos. No andar de cima, havia acomodações para 12 missionários ou membros da família de Betel. O novo prédio era realmente um “lar” em todos os sentidos da palavra. A construção foi completada em outubro de 1961, e o novo prédio foi dedicado no dia 21 daquele mês.
Seja mencionado que, por causa de responsabilidades pessoais, o irmão Pedersen teve de deixar o campo missionário e voltar para os Estados Unidos com sua esposa. Por isso, em abril de 1961, o irmão Don Burt foi nomeado superintendente da filial do Peru.
CATÁSTROFE EM ICA
Os discípulos de Jesus Cristo têm o sinal identificador do amor. (João 13:34, 35) Quão bem isso foi demonstrado em março de 1963, quando sobreveio uma catástrofe à cidade de Ica a 270 quilômetros a sudeste de Lima! Em virtude de enganos cometidos pelos que controlavam as eclusas do rio, a cidade e muitos vinhedos foram inundados. As águas arrastaram o Salão do Reino local, bem como muitas casas, inclusive as de algumas Testemunhas.
Mas, o amor cristão entrou em ação. O povo de Jeová em todo o Peru agiu de modo unânime. Formou-se prontamente um fundo de socorro e duas toneladas de roupa, também de alimentos, foram enviadas aos concrentes flagelados de Ica. Sim, os servos de Deus se interessam realmente uns pelos outros.
SUPERAR PROBLEMAS DE CONSTRUÇÃO DE SALÃO DO REINO
Além do amor que possuem entre si, os do povo de Jeová manifestam outras qualidades piedosas que amiúde contribuem para o êxito de seus empreendimentos. Isto pode ser ilustrado por aquilo que aconteceu em Trujillo em meados dos anos 60. Por causa do rápido crescimento na congregação, o Salão do Reino não podia comportar a todos e havia necessidade de um novo salão. Felizmente, Jeová abriu o caminho para os irmãos adquirirem um terreno e um empréstimo para a construção do Salão do Reino.
Não demorou muito e as Testemunhas locais estavam na obra, transportando tijolos ou barras de ferro e trabalhando arduamente no local da construção. Ora, até mesmo as irmãs se tornaram bem competentes em misturar cimento “à mão”, visto que não tinham betoneira!
Houve muitos obstáculos. Por exemplo, o irmão designado para cuidar da “papelada” precisava de um engenheiro para assinar as plantas. Ora, um engenheiro pedia o equivalente de Cr$ 3.300,00 só para assiná-las, outro, Cr$ 4.500,00 — somas que os irmãos não podiam pagar. Mas o problema foi solucionado de modo extraordinário.
Certo dia, o irmão que estava cuidando da “papelada” estava na fila de um banco quando um homem o empurrou e furou a fila na frente dele. O irmão se contrariou com isso, mas exerceu o fruto do espírito do autodomínio e não disse nada. Naquele mesmo dia alguém sugeriu que ele entrasse em contato com certo engenheiro para obter a assinatura necessária nas plantas. Pois bem, o engenheiro era a pessoa que passara na frente do irmão no banco. Esse senhor se mostrou muito amigável, disse que gostava de ajudar boas obras, e assinou prontamente os papéis, pedindo apenas o equivalente de Cr$ 330,00 como pagamento. Deveras, demonstrar as qualidades cristãs pode ser recompensador. Atualmente, o Salão do Reino em Trujillo se eleva como testemunho mudo a favor das excelentes qualidades manifestadas pelos cristãos daquela vizinhança bem como de seu trabalho árduo.
OUTRA VEZ ALGO VISTO PELA PRIMEIRA VEZ EM RELAÇÃO A UMA ASSEMBLÉIA
Nossa primeira grande assembléia internacional foi realizada em Lima de 4 a 8 de janeiro de 1967. Os irmãos peruanos ficaram muito contentes de acolher entre os congressistas muitos concrentes de outros países, bem como alguns diretores da Sociedade. Quase 500 Testemunhas de vários países estavam presentes e isso certamente edificou os irmãos e irmãs peruanos.
O irmão F. W. Franz proferiu o discurso principal perante 5.940 congressistas no sábado à noite. Mas a maior assistência numa assembléia no Peru até então foi no dia seguinte por ocasião do discurso do irmão Knorr. Foi de 6.925 pessoas. Uma excelente assistência, pois o auge no número de publicadores do Reino no Peru em 1967 fora de apenas 2.810.
Em 1969, 51 missionários, superintendentes de circuito e outros irmãos no Peru se beneficiaram dos arranjos feitos pela Sociedade para os ajudar financeiramente, a fim de viajarem para assembléias no estrangeiro. Isto foi certamente apreciado e esses congressistas regressaram a este país com riquezas espirituais para partilhar com seus concrentes. Entretanto, tivemos nossa Assembléia de Distrito “Paz na Terra” em Lima em janeiro de 1970. Que regozijo foi ver um auge de assistência de 7.414 pessoas naquela reunião! A incrementada atividade certamente produzira frutos em fins dos anos 60, pois a assistência à Comemoração de 1969 foi de 13.751 pessoas.
Entramos na década de 1970, e a obra de declarar as “boas novas” ia bem nesta antiga Terra dos Incas. Mas o que nos aguardava nos meses e anos à frente?
A TERRA TREME!
Uma das piores catástrofes da história do Peru ocorreu no domingo, 31 de maio de 1970, às 15,30 horas. Um terremoto gigantesco abalou então literalmente as vilas e as cidades nos Andes e nas áreas costeiras. Muitos do povo de Jeová foram atingidos, e os Salões do Reino foram danificados ou completamente destruídos em Chimbote, Casma, Huaraz, Trujillo e outros lugares.
As notícias sobre o terremoto ocorreram no mundo inteiro. Quase com a mesma rapidez, o povo de Jeová entrou em ação. Foi certamente animador ver a sua reação. Os cristãos no Peru e em outros países vieram logo em ajuda de seus irmãos flagelados. A sede da Sociedade Torre de Vigia em Brooklyn enviou 25.000 dólares (cerca de Cr$ 750.000,00) para socorrer os irmãos e para a reconstrução, bem como 15 toneladas de roupa. Os próprios irmãos peruanos contribuíram o equivalente de Cr$ 92.730,00, e de outras partes do mundo inteiro chegaram Cr$ 62.520,00. Foram recolhidas sete toneladas de roupas das congregações de Lima. Mais tarde, por algum tempo, foram fornecidos fundos para a reconstrução de três Salões do Reino em Chimbote, um em Huaraz e os salões de Máncora e Sullana que foram danificados por terremotos subseqüentes.
Embora o principal terremoto ocorresse na tarde de domingo, as estradas não foram abertas senão tarde da noitinha da terça-feira seguinte, e houve muita especulação pelo rádio quanto a se se permitiria aos carros particulares usá-las. Destemidos, os irmãos carregaram quatro carros ou camionetas e um caminhão de 10 toneladas de suprimentos e foram até a área atingida, na quarta-feira, à uma hora da madrugada.
Chegaram primeiro à cidade de Casma, onde havia naquele tempo uma congregação de 20 publicadores. A maioria das construções em Casma era de tijolo cru e havia desabado, transformando-se num montão de escombros e sufocante poeira. Até mesmo o hospital da cidade, embora de concreto armado, havia desabado. Infelizmente, um irmão, confinado a uma cadeira de rodas, não pôde escapar e morreu durante a catástrofe. Os suprimentos destinados à distribuição entre os irmãos foram confiados a um pioneiro especial.
Daí, foram a Chimbote, com uma população calculada em 200.000 habitantes. Umas 300 Testemunhas estavam associadas com as três congregações naquela cidade. Todas as casas haviam sido destruídas e os Salões do Reino ficaram danificados. Não obstante, os irmãos haviam retirado os escombros do chão de cimento de um salão e colocado esteiras de palha que serviam de parede, e realizaram seu estudo bíblico semanal de congregação ali na noite de terça-feira. Os primeiros suprimentos de alimento, água potável, cobertores, roupa, etc., para os flagelados chegaram na manhã seguinte.
Mas como estavam as Testemunhas em Huaraz e Caraz, no alto das cordilheiras dos Andes? Segundo noticiado pelo rádio, as cidades ali foram a bem dizer varridas, quer pelo abalo sísmico, quer por uma gigantesca barreira que caiu quando parte do monte Huascarán se precipitou num lago vizinho. Embora aviões e helicópteros tivessem deixado cair suprimentos nas áreas atingidas, passaram oito dias antes de ser anunciado pelo rádio que a estrada estava transitável. Imediatamente, alguns irmãos carregaram dois veículos de suprimentos e foram a Huaraz onde havia uma congregação de 20 publicadores e dois pioneiros especiais.
Houve demoras e perigos na estrada. Finalmente, porém, cedo na manhã de quarta-feira os irmãos chegaram a Huaraz, que fica a uma altitude de cerca de 3.000 metros. Pequenos acampamentos haviam surgido em toda a volta da cidade e foi bastante difícil localizar os irmãos e as irmãs. Finalmente, porém, às 17 horas, foram encontrados em choupanas feitas de ramos de eucaliptos. Que regozijo foi vê-los! E quão alegres ficaram de receber os suprimentos, que incluíam alimentos, remédios e fogões a querosene que os ajudariam a se manter aquecidos durante as noites, que eram extremamente frias!
Apenas duas pessoas associadas com a congregação Huaraz ficaram feridas; nenhuma Testemunha ali pereceu na catástrofe. Uma irmã ferida havia sido apanhada por helicóptero e transportada para Lima para receber assistência médica. E um jovem irmão, que ficara soterrado debaixo de escombros, mas que havia sido retirado com apenas uma fratura no queixo, acompanhou os irmãos até Lima ao regressarem.
EM DIREÇÃO A CARAZ
Foi só algum tempo mais tarde que pudemos chegar à cidade de Caraz, onde havia um grupo isolado de sete irmãos. A queda de barreira havia soterrado completamente duas cidades entre Huaraz e Caraz, impedindo totalmente o trânsito por terra.
Por volta de 1.º de julho de 1970, requeremos um salvo-conduto para viajarmos nas montanhas até Caraz passando por Huaraz. Acontece, porém, que havíamos programado subir a montanha quando o tráfego estava só em sentido descendente. Contudo, o irmão designado para obter o salvo-conduto descobriu que a pessoa que o concedia era alguém com quem ele tinha dirigido estudo bíblico. O resultado foi que o oficial concedeu ao irmão o salvo-conduto para uma caravana de cinco carros e escreveu no documento as palavras “Dar Prioridade à Caravana das Testemunhas de Jeová”. Embora nossos irmãos fossem parados três vezes, em cada caso o salvo-conduto valeu.
Depois de uma parada em Huaraz, quatro dos cinco automóveis se dirigiram a Caraz. Passaram sem dificuldade pela primeira barreira caída — a que havia atingido a cidade de Ranrahirca. Os engenheiros haviam construído uma estrada improvisada no meio da lama. Enquanto os irmãos estavam pensando sobre o que fazer a seguir, um capitão da Guarda Civil se aproximou do carro e perguntou se o poderiam levar até Yungay, a cidade seguinte que ficara soterrada. Todos concordaram em fazer isso.
Enormes rochas e pedras haviam sido lançadas em toda parte. Em certo lugar, os carros tiveram de descer até um rio recém-formado que fluía velozmente. Três conseguiram fazer a travessia, mas um dos carros teve de voltar.
Em Yungay, a seguinte cidade soterrada, o cheiro não era muito agradável, pois havia muitos cadáveres à vista perto das extremidades da barreira. Partindo de Yungay, os irmãos e o capitão continuaram a viagem até Caraz. Foram até onde puderam pela estrada preparada pelos operários. Daí, começaram a atravessar a desolação sem estradas. Tudo correu bem até que chegaram a um lugar em que o chão estava cedendo e ambas as rodas traseiras se afundaram até o eixo. Todos saíram do automóvel. O capitão foi chamar umas 20 pessoas da equipe de trabalhadores da estrada e, embora o terreno não fosse muito firme, empurraram o automóvel até que o conseguiram retirar. A viagem prosseguiu de lá até Caraz sem muita dificuldade.
Caraz se achava no caminho da queda da barreira que havia seguido o curso do rio, mas a barreira havia desviado seu curso pouco antes de atingir o povoado. Embora a maior parte das casas de tijolo cru fossem danificadas pelo terremoto, o povo em geral havia conseguido salvar seus bens. Nossos irmãos estavam bem, embora muito necessitados de alimentos e remédios. Nós lhes deixamos tendas, alimentos, cobertores e lanternas.
Os irmãos de Caraz nos acompanharam até Yungay. Ao começarem a carregar suprimentos adicionais nas costas para os levar de volta a Caraz, o capitão que nos acompanhava parou um caminhão e disse ao motorista: “Leve estas coisas e estas pessoas até onde você vai.” Portanto, nossos irmãos, bem como aqueles carregamentos pesados, foram levados por pelo menos três quartos do caminho através da barreira de Yungay. De lá, a viagem foi relativamente fácil para eles. Falando-se de passagem, tudo isso aconteceu durante o período em que não era permitido tráfego naquela região. Portanto, as Testemunhas de Jeová foram os primeiros a ter acesso de automóvel a Caraz.
Nas semanas seguintes, nossos concrentes nas áreas devastadas foram fortalecidos ainda mais mediante visitas de seus irmãos espirituais de outras partes do Peru. Com efeito, durante aquele período, realizou-se uma assembléia de circuito em Chimbote, para a grande surpresa dos residentes da cidade. Essa assembléia revelou-lhes que o povo de Jeová tem interesse mútuo.
Foi notável durante a crise a mão orientadora de Jeová, tão evidente em guiar seu povo. Certamente, os irmãos e as irmãs nas áreas atingidas apreciaram profundamente a ajuda e a generosidade de seus co-adoradores de Deus. Naturalmente, damos em especial a Jeová o crédito pelo resultado das coisas durante aquele período de catástrofe e somos profundamente gratos pela Sua infalível orientação e ajuda.
PREGAÇÃO EM TERRITÓRIOS VIRGENS
Em 9 de abril de 1971, a assistência total na Refeição Noturna do Senhor em todo o Peru foi de 18.397 pessoas. Naquele ano, tivemos um auge de 5.384 publicadores do Reino, ou um publicador para cada 2.600 habitantes. Portanto, restava ainda muito trabalho a fazer no serviço de Deus. Com efeito, embora as regiões urbanas precisassem receber maior testemunho, há muito nos perguntávamos como cobriríamos nosso vasto território rural. Havia um vale habitado após outro nas acidentadas montanhas dos Andes — um vasto território virgem.
É verdade que os pioneiros especiais e alguns irmãos desejosos de servir onde a necessidade é grande já haviam feito algum trabalho nesses territórios. Por exemplo, Alfredo Diaz que era pioneiro especial, e 16 outros percorreram durante 20 dias o norte do Peru para dar testemunho. Colocaram centenas de publicações e encontraram muitas pessoas de coração honesto. Mas havia muito mais para fazer em todo o país!
Felizmente, a mão de Jeová nunca é curta. Assim, em maio de 1971, houve um evento que permitiu melhor cobertura dos nossos territórios virgens. Um casal que estava visitando seu filho no Peru se perguntou também como se poderia levar a mensagem do Reino a todos os habitantes isolados deste país. Ao regressarem aos Estados Unidos, enviaram para seu filho um carro-camping autônomo, plenamente equipado para uso nos Andes. Enviaram também para este fim duas motocicletas.
Com isso, abriu-se de repente um novo campo de atividade. O missionário Joe Leydig e três pioneiros especiais (um deles falava o dialeto nativo, o quíchua) foram designados para usar o carro-camping. Foi chamado Casa Luz. Os quatro irmãos usaram também um jipe de marca Land Rover que foi comprado localmente.
Em 21 de maio de 1972, os quatro proclamadores do Reino, de tempo integral, começaram sua atividade. Qual era a sua designação? O vale Urubamba, outrora considerado sagrado pelos incas. Situa-se a elevada altitude nas montanhas entre as cidades de Cusco e Machu Picchu, a última fortaleza inca.
ESFORÇOS SINCEROS PRODUZEM BONS RESULTADOS
Em três meses e meio de pregação por todo o vale, os quatro irmãos colocaram 5.042 livros e 9.146 revistas. Para cobrirem eficazmente as zonas rurais, nossos irmãos se levantavam às cinco horas da manhã e davam testemunho aos camponeses que partiam para ir trabalhar nos campos. Os vilarejos ao longo da estrada eram cobertos rapidamente. Mas o que dizer dos nas elevadas altitudes no flanco das montanhas e cercados de terraços e ruínas antigas? Para chegarem a esses vilarejos, os irmãos, carregando sacolas cheias de livros, tinham de subir a pé por trilhas escarpadas.
Fato interessante, cada vilarejo parecia ter sua própria personalidade. Num deles, só crianças de 10 a 14 anos de idade ficavam com os livros. Os pais não queriam nada. Em outro vilarejo, todos — homens e mulheres — tinham ficado literalmente “inconscientes”, pelo que parece estando sob o efeito de uma bebida local que deve ter havido em abundância durante a fiesta da noite precedente.
No vilarejo seguinte, só três pessoas foram encontradas; todos os demais estavam nos campos. Para se chegar até o próximo vilarejo foi preciso subir um pouco. Mas valeu a pena o esforço. Encontrou-se bastante interesse. Poucos tinham dinheiro para obter publicações, mas todos estavam dispostos a trocá-las por alguma coisa. No fim da manhã, nossos irmãos estavam carregados de gêneros alimentícios ao voltarem a pé até a Casa Luz. Um deles tinha uma sacola cheia de milho; outro uma pasta cheia de batatas-doces. Joe Leydig tinha guardado dois ovos no bolso em troca de diversas revistas, mas infelizmente esqueceu-se deles até que se encostou no jipe.
Mais tarde naquele dia, trocaram um livro e uma Bíblia por um carneiro vivo — carne fresca para a refeição! Outro livro e duas revistas foram trocados por 15 abacates. Uma coleção de cinco livros foi dada em troca de umas 200 bananas. E um homem interessado lhes colheu alegremente quase dois quilos de café em grão para trocar por um livro. Na cidade mais próxima, de qualquer tamanho, tais itens podiam ser vendidos e o dinheiro ser usado para comprar a necessária gasolina.
Quanto tempo algumas pessoas levavam para abandonar suas práticas babilônicas? Pois bem, quando dois irmãos revisitaram certo senhor, a palestra foi em torno de doutrinas e se lhe mostrou que a Bíblia condena a idolatria. Com isso, o homem meneou a cabeça e levantou os olhos para as imagens que adornavam a parede de sua casa de adobe. Uma por uma, ele as pôs abaixo, foi para fora, despejou querosene sobre as imagens e as queimou perante os irmãos.
Requer paciência e determinação o trabalho nas regiões remotas que estão isoladas por causa de numerosas cadeias de montanhas e de vales quase inacessíveis. Às vezes, as motocicletas eram muito práticas para isso. Por exemplo, dois dos pioneiros foram com dificuldade de motocicleta até a cidade de Lares. Chegaram ali com maletas cheias de publicações e diversas caixas de literatura amarradas nas motocicletas. Foi um maravilhoso dia dedicado a dar testemunho naquela cidade. Naquela noite, diversas pessoas interessadas se reuniram para ouvir um discurso bíblico. Assim, essa viagem também foi compensadora.
“A ARCA” E “O ESCORPIÃO”
Até então, a Casa Luz era usada principalmente no serviço feito no sul do Peru. Mas que dizer das regiões centrais e do norte? Bem, foi possível comprar um chassi de caminhão e construir um novo carro-camping, bastante forte para suportar o rigor das estradas e caminhos rurais. Como este veículo era o formato de uma caixa oblonga, foi chamado “A Arca”. Este nome era também adequado porque os cinco pioneiros que usavam o veículo levavam para dentro dele amiúde animais vivos como carneiros, galinhas, porquinhos-da-índia, perus e patos que recebiam em troca das publicações que deixavam com as pessoas.
Além da “Arca”, que se pôs em serviço em 1973, um terceiro veículo se tornou disponível para uso no que poderíamos chamar de expedições de testemunho. Foi chamado “O Escorpião”, um nome que se escolheu tendo-se em mente a linguagem figurada de Revelação 9:3-5.
Assim, pois, todas as regiões do Peru — do norte, do centro e do sul — foram alcançadas mediante o trabalho árduo dos proclamadores do Reino, de tempo integral, que cobriram os territórios não-designados deste país. Milhares de livros, folhetos, tratados e revistas foram colocados com os índios de língua quíchua, aimará e espanhola. Aonde quer que nossas três unidades móveis iam — quer dentro da selva, quer aos povoados mineiros situados nas altitudes de 4.900 metros — faziam um excelente trabalho. Em 1978, a Casa Luz ainda estava sendo usada em territórios não-designados e para levar a mensagem do Reino até algumas regiões remotas do Peru.
DISSEMINAÇÃO DA VERDADE NA SELVA AMAZÔNICA
Mas espere! Havia uma região no país à qual os carros-camping não podiam chegar — a vasta selva do nordeste do Peru. Era em grande parte também um território não-designado. Como seria atingida essa área?
A região amazônica abrange muitos milhares de quilômetros quadrados de intricada selva atravessada em toda direção por rios grandes e pequenos. Ao longo de suas margens há centenas de pequenas chácaras ou sítios, e há vilarejos por toda parte. Diz-se que cerca de 37 tribos diferentes de índios vivem no território amazônico. Algumas dessas sofreram pouca influência da chamada civilização, ao passo que outras foram atraídas pelo modernismo. Como disseminaríamos a verdade entre essas pessoas isoladas na selva?
Em 1973, Cesar Chavez, Manuel Molina e Americo Matsuda se reuniram para executar um projeto de construir um barco para uso na pregação ao longo dos rios da selva. O barco foi logo construído na cidade portuária de Callao, sob a direção do missionário Walter Akin. Ao ser completado, o barco foi dividido em duas partes. Essas seções foram transportadas para a cidade de Pucallpa, onde foram reajuntadas. Chamado El Refugio, o barco de 15 toneladas foi lançado nas águas do rio Ucayali.
Selecionou-se cuidadosamente entre os pioneiros especiais uma boa equipe. Primeiro, era preciso que todos os seis irmãos soubessem nadar. Também, esses homens tinham de ser capazes de suportar os rigores da vida na selva. Seu território não seria de forma alguma fácil.
Um dos primeiros povoados visitados foi Nuevo San Juan, onde cerca de 500 pessoas residiam em casas ao ar livre, tendo como abrigo simples cobertos de colmo. Quando os irmãos chegaram ali, os habitantes (na maioria protestantes) estavam certos de que poderiam converter os visitantes para sua religião. Mas, em pouco tempo, aconteceu exatamente o contrário. Os pioneiros iniciaram muitos estudos bíblicos domiciliares, e logo 23 pessoas em média assistiam aos discursos e às reuniões que se organizaram naquele vilarejo.
Os pioneiros efetuaram o que se poderia chamar de ‘estranho intercâmbio’ com os indígenas das tribos chipibo e conibo. Fizeram um intercâmbio de idiomas! Com efeito, os tribais ensinavam seu dialeto aos pioneiros que, por sua vez, lhes ensinavam o espanhol e a verdade bíblica.
O povoado de Contamana, entre Pucallpa e Iquitos, estava cheio de pessoas interessadas na Bíblia. As pessoas procuravam os pioneiros tanto de dia como de noite para lhes fazer perguntas bíblicas e adquirir publicações. Exemplares do livro Sua Juventude — O Melhor Modo de Usufruí-la saiu como “água”. Entre muitos dos 10.000 habitantes de Contamana, foi possível iniciar estudos bíblicos, diversos dos quais se desenvolveram mais tarde em reuniões de congregação.
PERIGOS NOS RIOS
Além das múltiplas dificuldades da vida na selva, os membros da tripulação de El Refugio enfrentavam outros perigos. Assim como o apóstolo Paulo enfrentou “perigos de rios”, estes pioneiros tiveram de enfrentar o Ucayali, um rio veloz e traiçoeiro. — 2 Cor. 11:26.
Na quarta-feira, 10 de agosto de 1977, às 3 horas da madrugada, sopraram bruscamente ventos tempestuosos sobre aquela região, causando uma súbita inundação. Rapidamente, aumentou o volume da água e o rio subiu formando agitadas ondas. Por causa das águas que subiam, as amarras de El Refugio se romperam de suas estacas, requerendo que um membro da tripulação que estava servindo de vigia desembarcasse e tentasse amarrá-las. Mas, em pouco tempo, o vento que soprava com violência arrancou todas as amarras e o barco ficou à deriva. Os outros membros da tripulação, que estavam dormindo durante todo esse tempo, acordaram e tentaram pôr o motor em marcha para lutar contra a fúria da corrente. Entretanto, foram inúteis seus esforços e tiveram de observar sem recursos as águas jogar a embarcação contra as margens escarpadas do rio.
Foi então que uma grande barreira, minada pelas águas furiosas, caiu dentro do rio. Isto fez com que o barco se inclinasse a estibordo, ficando os irmãos presos dentro dele. Felizmente, porém, uma das portas corrediças estava aberta. Embora isto fizesse com que o barco afundasse mais rapidamente, proveu abertura para os pioneiros abandonarem rapidamente o barco. Todos saíram! Nas densas trevas da noite, os irmãos nadaram com segurança até à margem. Com efeito, todas as suas publicações, roupas, utensílios de cozinha, sacolas de livros e objetos de uso pessoal desapareceram no rio faminto. Mas eles estavam ali — com vida! Elevou-se a Jeová uma oração fervorosa de agradecimentos pela sua proteção.
Cedo ao amanhecer, os irmãos puderam ver seu barco, uma ponta estando suspensa aparentemente por causa de uma massa de ar retida na proa. O barco flutuava suavemente nas águas que então estavam calmas, mas não havia tempo a perder. Às 7 horas, com a ajuda de cabos e dois tratores que pessoas do povoado bondosamente haviam emprestado, o barco foi puxado para a margem. Mais tarde naquele dia, um enorme barco-guindaste, que pertencia a uma companhia de petróleo, pôde endireitar o barco que pesava 15 toneladas e pô-lo novamente a navegar. Mais uma vez os irmãos expressaram agradecimentos a Jeová, desta vez por abrir o caminho para a recuperação tão rápida de sua casa flutuante!
Quando as notícias dessa adversidade chegaram aos ouvidos dos irmãos em todo o Peru, enviaram contribuições e suprimentos em grande quantidade. Assim, foi possível equipar os pioneiros para continuarem o serviço ao longo dos rios da bacia amazônica.
CONTINUA A EXPANSÃO
Nesse meio tempo, a atividade intensificada que o povo de Jeová empreendia em todo o Peru nos fez ver a necessidade de maiores dependências. A assistência à Comemoração de 1972 chegou a ser de 19.772 pessoas. Não era de surpreender, pois, que, durante uma breve visita dos irmãos N. H. Knorr e M. H. Larson, foram feitos arranjos para a compra de um terreno baldio ao lado do prédio da filial.
A obra do anexo da filial começou em março de 1973. O projeto recebeu bom apoio dos irmãos e, apesar da escassez cada vez maior de material de construção, a nova estrutura tomou logo forma. No segundo andar, havia um espaçoso Salão do Reino que podia comportar confortavelmente 300 pessoas sentadas. No terceiro andar, achavam-se os dormitórios de missionários designados para trabalhar nas congregações vizinhas. O anexo da filial foi dedicado em 19 de janeiro de 1974 pelo irmão N. H. Knorr, que falou nessa ocasião perante 456 felizes testemunhas de Jeová.
Naquele mesmo mês, realizou-se a Assembléia Internacional “Vitória Divina” em Lima. Esse congresso foi certamente de importância aos olhos dos que haviam observado nossa obra crescer neste país no decorrer dos anos. Entre as 19.738 pessoas presentes (a maior assistência numa assembléia até aquele tempo) havia congressistas do Canadá, dos Estados Unidos e da Europa. Haviam sido elaborados interessantes programas em inglês e excursões para esses visitantes. Danças folclóricas em trajes coloridos completavam as apresentações históricas e informativas. Deveras, aquela assembléia foi um deleite para os congressistas estrangeiros, bem como para os cristãos peruanos.
Com o contínuo aumento, a maior parte dos locais se tornaram muito pequenos para nossas assembléias. Também, não podíamos usar a maioria dos estádios esportivos, porque eram proibidas as reuniões religiosas neles. Portanto, os circuitos de Lima designaram uma comissão e não demorou muito para se comprar um local ideal para assembléias numa zona não-desenvolvida chamada Campoy a apenas 20 minutos de carro do centro da cidade. Naquele lugar quieto e tranqüilo, os trabalhadores voluntários e entusiásticos labutaram para preparar um excelente local de assembléias, provido de todas as dependências necessárias. Estava pronto a tempo para as duas assembléias de distrito de 1976, às quais 18.914 pessoas no total assistiram. Cerca de um ano mais tarde, as dependências do local de assembléias e as diversas estruturas anexas foram dedicadas durante a visita de A. D. Schroeder, membro do Corpo Governante das Testemunhas de Jeová. Naquela ocasião, 14.353 pessoas estiveram presentes, representando 96 congregações da grande Lima e cidades vizinhas.
Em 1977, o amor e a atenção do Corpo Governante impressionaram certamente os irmãos no Peru, porque durante aquele ano usufruíram não só uma visita, mas duas visitas por parte de membros do Corpo Governante. O irmão Grant Suiter, junto com sua esposa, Edith, passaram na filial seis dias que simplesmente voaram. O irmão Suiter falou também perante uma multidão de 15.056 pessoas no local de assembléias em Campoy.
CONTINUAMOS “BRILHANDO COMO ILUMINADORES”
O ano de 1978 revelou ser muito atarefado para o povo de Jeová no Peru. Nossas quatro Assembléias de Distrito “Trabalhadores Jubilosos” atraíram uma assistência de 28.063 pessoas no total, e 636 foram batizadas durante essas assembléias em símbolo de sua dedicação a Jeová Deus. Temos atualmente 12.925 proclamadores do Reino que difundem a luz espiritual e a verdade nesta antiga Terra dos Incas.
Quão gratos somos a Jeová pelas muitas provisões espirituais através dos anos! Por exemplo, não só temos tirado proveito da obra missionária de irmãos e irmãs enviados aqui depois de terem sido treinados na Escola de Gileade, mas algumas Testemunhas peruanas receberam tal treinamento. Também, desde o começo da Escola do Ministério do Reino no Peru, em 1962, ela tem sido muito proveitosa. E quão gratos somos pela atual Escola de Pioneiros! Toda essa aprendizagem proveitosa, junto com muitas outras ricas provisões espirituais feitas pelo nosso amoroso Pai celestial, nos habilitam a continuar a servir como eficientes portadores de luz
Portanto, os cristãos peruanos olham para o futuro confiantes em Jeová. Estamos decididos a continuar o serviço do Reino, quer nos altos Andes, ao longo de intricados caminhos na selva, quer em outras partes do nosso vasto território. Quão felizes somos deveras de servir fielmente com nossos concrentes em toda a terra à medida que vamos “brilhando como iluminadores no mundo”! — Fil. 2:15.
[Mapa na página 200]
(Para o texto formatado, veja a publicação)
PERU
Contamana
Chosica
Callao
Lima
Huancayo
Ayacucho
Iquitos
Moyobamba
Trujillo
Chimbote
Yungay
Huaraz
Cusco
Lares
Arequipa
Puno
Ica
Oceano Pacífico
EQUADOR
COLÔMBIA
BRASIL
BOLÍVIA
CHILE